Um dia, caminhando rumo a sabe-se lá onde na rua São Clemente em Botafogo, eu cheguei a uma conclusão que como tal mais tarde eu viria a descobrir ser precipitada. Eu estava me sentindo sozinho nesta cidade do Rio de Janeiro, de não sei quantos milhões de habitantes. Havia perdido uma amiga faziam alguns dias e estava completamente recluso, negando a tudo, à diversão, aos estudos, aos compromissos. Nada parecia dotar a minha vida de sentido. Eu não entendia, mas estava experimentando a morte.
Foi nessa caminhada pela rua São Clemente (confesso não saber qual era o destino), que eu concluí que quanto mais amasse, mais dor eu sentiria. Era óbvio, que brilhante!, eu havia descoberto alguma coisa realmente séria e importante sobre a vida: quanto mais se ama mais se pena. Sim, eu realmente acreditei nisso durante muito tempo e tenho certeza que até hoje não me curei por completo. Eu conservo ainda em mim alguma resistência que me faz ser meio... Como dizer? Meio assim incapaz de estar lá ou cá. Um bicho meio assim assumidamente rachado.
Eu entendi errado a oração quanto mais se ama mais se pena. E danei a escrever sobre tudo o que mais me atormentava. Caramba, eu caí na cilada das palavras e acreditei não na dor - que sentia - e sim em sua metáfora esvaziada. E fiz pior, tão logo descobri meu erro: decidi também penar como aquele que sofre de verdade. E sofri a vida, sofri a esquina, o pão, o leite e o ar de cada dia. Eu estive embriagado durante muito tempo sofrendo o real e sofrendo a poesia. Eu gabaritei em Sofrimento I, II e III; eu cheirei a morte e fiquei alucinado. Assim, eu acabei dando em mim.
Foi um erro sim, mas que assim me fez. Alguém que desconfia um pouquinho de cada coisa. Não que não seja capaz de simplesmente ir - eu vou! pode me chamar! -, mas, é preciso dizer, o pé atrás me faz lidar com certas coisas que a vida faz brotar na sua frente e que, sem jogo de cintura (como diz a minha mãe), não se conseguiria seguir adiante. Naquele dia (eu me lembro), eu quase aceitei ser triste para o resto da vida.
É só que estando assim tão perto dos familiares, eu fico vendo neles as minhas impossibilidades antigas ainda persistindo e sendo recusadas, como se o choro fosse sempre reação errada. A gente que lê e se diz poeta teima em ver profundeza até em carta de baralho. Ai eu não aguento e tento amenizar a dor mostrando que ela ainda é pior. Não, eu não aprendi a viver e eles não, é só que o medo vem quando as coisas começam a mostrar mais pernas e braços do que a fantasia que pusemos nelas foi capaz de esconder. E sim, cara, você vai ter que lidar com isso. Nada vai ser completo. Nada vai ser completamente vazio. Tudo, no final das contas, vai ser o tal meio do caminho.
O meio é também uma forma de seguir.
Algumas felicidades nesta vida nos chegam como fagulhas, como traços, riscos, ou seja, tudo de certa forma é passageiro. Estar completo, estar cindido. Tudo vem e vai e esse parece ser mesmo o ciclo. É mais justo encarar a vida de frente, sem subterfúgios. Nesse dia, eu fui posto contra a parede e obrigado a escolher: ou eu seria triste, ou eu escolheria viver.
Bom, eu escolhi ser triste. Devo admitir. E hoje vivo pleno na confusão do que sinto do que vejo do que crio. Mas eu vivo, sabe? Por vezes recolhido demais, na tal solidão essencial que o artista parece querer. Eu sou meio... Sozinho. É assim que se fala? Eu sou sozinho, mas não incapaz de te receber. Meu tipo é desses que enche a caneca de café e fica a se rever e se revistar. Eu me coloco no colo e me faço autópsia, para sempre abrir e fechar, para sempre descer as fantasias e ver a minha pele naquilo que ela tem de pele (e não de esconderijo).
Sem essa brincadeira de ver pena onde nem sempre tem, eu não saberia viver. Foi no dia em que eu aprendi a me fazer chorar, que eu descobri que era capaz de sarar.
3 comentários:
shuzy e borboletas nos olhos,
obrigado pela presença.
mesmo,,,
aceito sugestões! mesmo!
feliz 2011!
diogo
se substituirmos a palavra "AMOR" por "ARDOR" na vida, talvez ela se aproxime mais da verdade.
a solidão necessária dos artistas?
a gente que lê e se diz poeta teima.
Olá, sr. espelho às avessas...pois eu fui lendo seu texto e quase, quase me vendo, só que escolhi a alegria ou ela me escolheu, sei lá. Mas ter o riso como par não me fez ignorar o fato de que não apenas estamos sós, mas somos sozinhos. Um lindo, lindo e tocante post. Beijos
Luciana
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