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domingo, 29 de dezembro de 2013

!!!!! Teatro Inominável !!!!! 5 anos !!!!!

Hoje, dia 29 de dezembro de 2013, o Teatro Inominável completa 5 anos de idade!
Na foto, Adassa Martins, Caroline Helena, Diogo Liberano, Flávia Naves e Natássia Vello.
Sem querer, em ordem alfabética!
                                                                                                                                                                                                      


                                                                                                                                   
                                   

                    

29 de dezembro de 2008.Vassouras, 29 de dezembro de 2008.


Eu poderia dizer que está cedo para escrever e pensar sobre esta peça. Mas eu estou pensando, inevitavelmente, então é preciso dar seguimento às idéias. Esta será a minha montagem de Direção V, porém, mais do que isso quero que seja a minha próxima direção. A ousadia e a pretensão vêm a favor do trabalho. Não ousadia em quebrar convenções e linguagens, nem pretensão no sentido de querer ser algo, mas ambos no sentido de avanço dentro do meu trabalho como diretor, como estudante de teatro.    
                                                                                         

quinta-feira, 26 de dezembro de 2013

Mãe

Descobri algo hoje sobre você:
poesia alguma será capaz de te conter.
Você é mais vasta que qualquer metáfora.
Por isso te admiro,
Porque achei esse tempo todo
ser poeta automático.
Não não não
Tu sempre esteve
Ditando o nexo
Ao meu lado.

Mentira ou não
Hoje este verso basta.

quarta-feira, 25 de dezembro de 2013

novembro_2013

janaína ramal 213
cpct do inominável
jazz
reunião vermelho
ensaio
ensaio
kopenhagen
joão volta!
joão vai!
que saco
cultura
livraria
festival
ceará
vermelho amargo
é isso
elenco Completo
cariri
crato
20h
21h
escrever selva
episódio piloto
texto do joão
MEDIDA PROVISÓRIA
tempo_festival
14h/17h
10h/15h
santa joana
natássia e paula
aniversário
amargo
prazo final
encontro rumos - márcio!
pagar as duas parcelas
dia 25 de novembro, ir para POA
---

outubro_2013

comecei o mês do meu aniversário
indo direto para porto alegre
primeira vez desde maio
que delícia
uma semana inteira
respondendo e-mail
atrasado!
de 30set a 7out
quando voltei
meu pai!
fluxorama fluxorama fluxorama
claudinho
ed
primot
helena
sinfonia
phil
miranda
concreto
pagar MEI
BELO HORIZONTE
feto
miranda
aniversário
26 anos
MEU PAI
estou bêbado
humalog
voltei correndo
festival direto para sala de ensaio
oi futuro
oi presente
flamengo
brasil, rio de janeiro
viajei mais rápido então
fui para RECIFE
para os amigos do magiluth
TREMA!
festival de teatro de grupo do recife
aniversário em outubro é muita coisa
muita gente
voltei para o rio às 06h
quase sem cenário
coisa de indigente
brecht
atrasado
tripés no avião
OCUPAÇÃO DO TEATRO INOMINÁVEL
NO TEATRO GLAUCIO GILL
comemorando durante uma semana
os nossos cinco anos
meu pai,
calma
CPCT
TEATRO É PÚBLICO
MIRANDA
SINFONIA
NÃO DOIS
DRAGÃO
CONCRETO
e a estreia de fluxorama
!

setembro_2013

festival de juiz de fora
não dois e miranda
oficina
fiz a barba no barbeiro
primeira vez do ano
desenhos feitos a mão
fluxorama
eu e helena
meu amor, via skype
fiz cicatriz nova
bati a perna na cama do hotel
me lembro com nitidez desse mês
voltei à juiz de fora
aniversário
reuniões da ocupação futuro do inominável
reduto santa joana
de novo e mais uma vez, fluxorama
rita inez e vini
paulinho reunião
ocupação \\
e de novo e mais uma vez, cadê o joão?
MEI
eu tenho um mei a pagar
viagem para são paulo
não sem antes dia 16
cinco meses desde que te vi pela primeira vez
humalog
avião
eu amo essas meninas (ada, nat, helena e flávia)
byron
são paulo
márcio abreu, nadja, giovanna, rodrigo
cia brasileira
uma delícia
um desespero
itaú cultural
miranda é isso mesmo
obrigado! VIDA !!!
prazos
textos miranda
conversa com eleonora
CONCRETO
estreia de LABORATORIAL
finalmente, antes disso porém,
dia 22 de setembro domingo
joão volta ao rio <<<
mas vai embora rapidinho
volta, amor!
aniversário vários
tempo_festival desde meses atrás
reunião meninos
não
choram...

agosto_2013

desde maio sem vê-lo
finalmente
na reestreia de vermelho
no eva herz
dia 1
joão arrives
por volta de 12h
de acordo com a agenda
até segunda dia 5, quando ele volta
eu nem sei
eu nem sei
repito, eu sei
aquela coisa
dia 8
assumimos tudo
risos
profundos
e nisso tem ação
performance
ensaios e encontros sem parar
o maracanã é eleito o meu alvo
felipe
cova
calouste
não dois
gabi
dragão
eva herz
ateliê
niver inez
overdose da helena
mtv
gripe
falta o amor
fome e sede
reunião
por skype
jantar
lascamo-nos
miranda
ensaios, poucos
escrevi um romance
ROMANCE DE ENVERGADURA
temas para o joão
o amor virou dramaturgia
FLUXO
fluxo?
LABORATORIAL
BRECHT
debate de vermelho
leituras
aquela coisa
estudos de dramaturgia contemporânea

julho_2013

luxação no dedo do pé
ensaio geral
mudou tudo
estreia de VERMELHO AMARGO
que felicidade imensa
nem sei descrever
reunião empresa inominável
temporada é aquela coisa
de sexta a domingo
durante quatro semanas
espaço sesc, em copacabana
viva o táxi!
estou gastando tudo o que não tenho!
encontros inominável
pela manhã
a qualquer instante
ensaios de não dois
ensaios na cia dos atores
message, message, message
marina
vianna
marina vianna
gunnar e vica
cova? cova mesmo
teo e brecht
gabi mendonça
encontros de concreto armado
projeto de CONCRETO
reunião no espaço sesc
!!!

junho_2013

padrão
repetição
beijos na boca, em uma ou outro ocasião
são paulo, sim
sopa
ensaios de vermelho
a louca!
maravilhoso em sampa
estreia
maravilhoso ao mesmo tempo no rio
no ccbb
junho eu vivi os dias mais felizes do ano
de acordo com a madrinha susan miller
a casa não sabe estreou e findou
de segunda à domingo
myriam muniz, encerrou a inscrição
debate com grupo magiluth
a coisa mais linda do coração
revista antropositivo
meu pai
minha agenda está limpa
quase sem rabisco
parece até que os finais de semana foram de descanso
cadê o joão?

maio_2013

mayonese
folha solta da agenda
por que será?
dia 1
JOÃO PEDRO MADUREIRA
aniversário
eu nem sabia disso quando chegou primeiro de maio
eduto
ensaios SINFONIA SONHO
parque das ruinas
prazer no ccbb
terceiro ato, domingo, andrêas e gunnar
vermelho direto pela manhã até início da tarde
reduto de tarde até a noite
A CASA NÃO SABE ainda não tinha nome
ensaios de SINFONIA SONHO nos fins de semana
MARAVILHOSO viaja o brasil
sem mim,
grechi's niver
reuniões mil
produção luz cenário
ir até cia dos atores
(fazer o quê?)
dia 16 de maio
meio do mês
19h para POA
tá escrito aqui
POA e João!
16 para 17, odeon, ode on!
dias 17 e 18 de maio de 2013
SINFONIA SONHO no festival palco giratório
em porto alegre/rs
nem cheguei a pisar no hotel
que horror!
o que fazer?
dia 19
ed moraes na gamboa
LIMPE TODO O SANGUE...
passaporte
maravilhoso em poa, sem mim
linney
eva herz
vermelho
reunião site
vermelho
kekel, minha amiga (você sempre por aqui)
dia 31 de maio, escrito aqui
PARA SP/
minha conta de telefone eu não sei quanto deu

abril_2013

dia 2
para curitiba
dia 3
coletiva de imprensa
MARAVILHOSO
dias 3 e 4
VAZIO É O QUE NÃO FALTA, MIRANDA
dias 5 6 e 7
alguns beijos
MIRANDA
que delícia
miris!bia!lu!
bia produção assessoria
galeão 18h20
andré coelho
val moira léo
val - café - ok
recebi algum dinheiro
cheguei no rio de volta de curitiba no dia 8 segunda
dia 9 fui para são paulo
EDUKATORS estreou em são paulo
voltei ao rio
ensaios de MESSAGE IN A BOTTLE (que viria a ser
LABORATORIAL)
ensaios de VERMELHO AMARGO
prazos vencendo
victor quesada,
marcar reuniões com toda a equipe
dani, storino, bia, assessoria
júlia!
call ernani
aniversário da inez?
ANTIMONOTONIA com a gabi
algumas dívidas a pagar
meu telefone veio 235,62
mas foi pago!

março_2013

carnaval?
quando foi?
não me responsabilizo!
nunca beijei tanta boca
na minha vida!
e olha que foi só boca!
agenda enlouquecida de tão rabiscada
espanca!
projetos NÃO DOIS e DRAGÃO
muitos aniversários!
reuniões intermináveis do INOMINÁVEL
ensaio aberto de MARAVILHOSO
inez viaja
meu pai!
enviar e-mail para bia
keli freitas mais adiante no ano entrará em minha vida
mas é aniversário dela
ensaios, ensaios, ensaios
duas apresentações de CARÍCIAS
que virou CRAVO
eu e gunnar borges dirigidos por thaís barros
em texto de sergi belbel
cerimônia de premiação do prêmio questão de crítica
às 20h
no mezanino
eu havia sido indicado por sinfonia sonho e pela mostra hífen
fui bêbado (porque sinto vergonha de mim mesmo) com adassa
muitos ensaios seguidos de MIRANDA
coisas inúmeras na sede \\
ANIVERSÁRIOS
encontro com tuninho
produção SINFONIA
quinta dia 21 teve show de estreia do ABRAÇAÇO
no circo voador
vini me deu de presente um ingresso
FOMOS
foi lindo
beijei na boca nesse mês
tem até um <3 desenhado
meu telefone veio 185,38
e vi aqui que minha mãe me deu de presente o plano de saúde do mês
não acaba
AMORES RISÍVEIS
VERMELHO
quinta seguida ao CAETANO
fui no show do HOT CHIP no circo voador
beijei na boca
e fiz sexo
horrores!
meu deus,
não acaba!

fevereiro_2013

dia 6 de fevereiro
ato contra o fechamento dos teatros no rio de janeiro
tem aqui na agenda
registrar texto de MARAVILHOSO e SINFONIA
tudo certo,
pulam-se dias
de ensaios, ensaios e ensaios
encontros de CONCRETO
e atos na frente da prefeitura do rio
tudo agendado
e participado!
duas apresentações de SINFONIA SONHO
no instituto galpão gamboa
comprar insulina
prazos para inscrições
encontro com sura
encontro com evângelo
ensaios de SINFONIA
aniversários
berlim, carnaval, MARAVILHOSO
LABORATORIAL (estávamos longe deste nome)
cia dos atores, filo, fentepp
coisas que estão aqui escritas
conta de telefone pela bagatela de 206,74
(eu preciso ganhar dinheiro)

janeiro_2013

virei o ano escrevendo a dramaturgia de MARAVILHOSO
comecei o ano escrevendo a dramaturgia de MARAVILHOSO
encontro na casa da inez viana
ensaios no reduto
ensaios também no oi futuro flamengo
teve a estreia de EDUKATORS
peça da qual fui diretor assistente
do joão fonseca
reunião no espaço sesc
com a bia
para fechar pauta de estreia de VERMELHO AMARGO
outras reuniões
primeiros encontros de CONCRETO ARMADO
ensaio de CARÍCIAS
com gunnar borges e thaís barros
peça que viria a se chamar CRAVO
reunião outra
mais reunião
dessa vez, daquela vez
com a tamires nascimento
na livraria prefácio
muitas contas para pagar
um calor tipo 50 graus
reunião
reuniões
davi de carvalho orçamento almoço
berlim?
sim, viria a ser LABORATORIAL
cesar augusto
e marcelo valle
muita conversa
muita conceito
muita coisa
pura delícia
meu aluguel aumentou no início do ano
63 reais
minha conta de telefone veio por apenas 198,64 reais
e eu terminei de escrever o primeiro
e o segundo ato de MARAVILHOSO
---

(mais outra) Carta a mim mesmo,

Vassouras, 25 de dezembro de 2013

Caro Diogo ---

Quem lhe escreve é você mesmo. Eu, nós, a gente, enfim, você. Escrevo a você para tentar deixar marcado, aqui neste blog, algum caminho possível dentre tanto descompasso seu. Sem exageros. Não vou fazer poesia. Vou tentar nas próximas linhas te dar um saldo possível deste instante nebuloso no qual você se faz e a partir do qual você caminha.

Hoje é dia pós-ceia de Natal. Você acordou por volta de 10h30 e ligou a música no seu tablet, escondendo-o sob o próprio travesseiro. Uma melancolia sorrateira acordou junto contigo, mas já se dispersou. E se eu te escrevo esta pequena introdução é apenas por cuidado contigo. Você, que aprendeu a se deixar em segundo plano para ver a flor do mundo florescer em riste.

Não, não há mais possibilidade de você ser triste. Conheceste a tristeza em alguns instante, em algum momento - preciso e precioso - você conheceu a tristeza e não se apaixonou por ela. Agora é tarde. A tristeza passa muitas vezes por nossas vidas, pela sua - ao menos - eu sei que passou várias, portanto, agora é tarde. Hoje você vai ser feliz. De agora adiante, só você felicidade.

Sim, eu sei, eu sei, sim, eu sei. Tu não acreditas em muitas coisas. Mas veja que engraçado, Diogo. Se você me permite, até janeiro deste ano você sequer acreditava em amor. Você não acredita em Deus, nem na Psicanálise, nem em Terapia. Você não acredita em nada - eu sei, não é por mal - porque para acreditar em alguma coisa (eu sei disso) é preciso ter as mãos sobre ela. Seu conhecimento de mundo é pelo toque (não pela fala).

Portanto, se te escrevo essas palavras agora, é para te devolver um pouco do mundo caminhado neste ano que em alguns dias se encerrará. Foste um ano muito positivo, em todos os sentidos: no trabalho, no amor e em família. Foi um ano papo reto. Sem pressa, mas sem aquela agonia (de sempre deixar ao tempo a resolução do que é de nossa responsabilidade).

Trabalho: por ir sem freio nem moral rumo a toda e qualquer fantasia. O desejo é a força motriz do seu instante passageiro. E por não temer passar, morrer, ser atropelado e consumido, a coisa fica, tal qual a noite sobrevive em poesia rima.

Amor: por ti, em primeiro. Mas tão logo tenha sido por ti, seu olhar abriu-se ao outro e tornou-se menos certo de si, tornou-se ansioso pelo cuidado do outro, pelo carinho alheio. Seu novo projeto de vida (e que seja novo assim por todo o instante) é cuidar do seu amor. Desse cara, de quem tanto amo.

Família: você disse, verbalizou: quero voltar a fazer parte da nossa família. Pronto. Primeiro passo. Demanda tempo. Pode ser que um ou outro morra no meio do caminho. Mas não, você andou. Andou demais. Disse a eles como bate aí dentro o seu peito (o nosso coração). Não dá para ser família sendo a si próprio pela metade.

Sem suicídios. A sua poesia, cada vez mais, é verso e não disparate. Já tens idade para discernir verso de pele. Não vá caindo tão fundo em toda estrofe porque o sentido da poesia é justamente manter o corpo de pé lá onde ele já cambaleia. A sua poesia é você quem escreve (por isso, talvez, neste ano que se encerra, você tenha escrito tão pouco).

(Pausa. Você descerá as escadas de sua casa de nascença e se dirigirá até a cozinha, onde encherá - mais uma vez - sua caneca com café preto).

De volta, o café acabou cedo hoje. O ventilador no quarto faz vento sobre os meus cabelos inertes. O que mais eu poderia te dizer, Diogo? Sobre ti? Sobre o que se anuncia sobre ti? Sobre o que vem no adiante? Algo que eu possa entregar que não seja de todo inventado? Que tenha desde já alguma chance?

Não. Deixe. Siga.

Feliz ano novo (ou o que quer que isso seja)

Do seu (mesmo),
Diogo Liberano

---

Máxima

Há um limite:
O hoje
Amanhã.

terça-feira, 24 de dezembro de 2013

Ainda o café.

Na boca
não o seu beijo
hoje não
Hoje apenas o café
descendo rápido
e acolhendo
o ânimo
Exaltado.

Na pele
não o seu toque
hoje não
Hoje apenas o silêncio
firmando inteiro
e por fim
a distância
Jurada de morte.

Nos olhos
não o seu gesto
hoje não
Hoje apenas o sorriso meu
surgindo lento
e passageiro
olhando a frente
onde nos, enfim,
Vejo.

Amor
A sua poesia em mim escorre sem pedir reconhecimento.

Eu sou você
por fora, amor
Por fim, coração
por dentro.

---

Para que fique claro.

Em épocas de tormenta
Tal qual este instante
Abrupto
e desfavorável à harmonia
Que fique claro
que aquilo que aqui escrevo
é tão somente poesia.

Poesia
Que fique claro
é a solução ainda não vinda
É a saída
nunca pensada
É o jogo aberto
com as quinas da vida
transformando ira
em estrada.

Portanto
Em épocas sem senso
tal qual o abrupto instante
No qual me sento
Assim
Em épocas como esta
Que fique claro
minhas palavras são só amigos
distantes
acariciando a possibilidade
do continuar
(para onde?)
adiante.

Adoraria,
despencar desta sacada no segundo andar.
Adoraria,
beijar o trem das onze.
Adoraria,
descobrir-me o câncer.
Adoraria,
saber o íntimo familiar
e não precisar me esconder.

Mas que fique claro
Que em épocas tal qual o instante
- e como esta na qual me escrevo -

Para que fique claro
eu repito o já dito no começo:
aquilo que aqui escrevo
é tão somente poesia.

Em outras palavras:
poesia é sim melhor que a vida.

Então ele me pediu uma coisa e eu disse não.

Eu não sei como dizer. E nem quero que você me entenda errado. Não acho que você tem que se preocupar com os outros, mas com ela você tem que se preocupar um pouco sim.
Depois ele fez uma espécie de silêncio, com medo de me deixar evidente que aquilo que ele estava me pedindo era sim, desde sempre, um abuso, uma falta de respeito, de noção e humanidade.
Eu fiquei mudo. E isso o fez continuar.
Exposição, sabe? Não precisa mostrar fotos beijando na boca, né?
Eu nunca tinha pensado sobre isso. Ele continuou:
Sabe? Acho que é muito recente e não precisa fazer esse tipo de coisa, na internet, enfim...
Eu então lhe disse algo tipo o seguinte:
Existem duas coisas: 1) não há nada de errado portanto nada exposto pode se tornar algo errado, porque está tudo certo. E 2) sabe? Eu preciso fazer uma força sim, para impedir que quem eu sou - tal como agora vocês sabem - possa se tornar uma poeira, uma farpa, uma coisa pequena no meio da família.

Eu não vou privar vocês de se lembrarem exatamente quem sou eu e como é a minha vida.

Em outras palavras, eu agora percebo: teremos uma noite de muitas revelações. Isso é o Natal. O momento em que Jesus Cristo chora (sangue) na cruz.

\\

Consistência.

CONSISTÊNCIA
s.f. Estado de um líquido que tende para a forma sólida.
Estado de resistência de um corpo.
Fig. Firmeza, solidez; coerência na exposição de idéias.

---

O café quente se transmuta em neurônios. Todos novos. E pré-excitados.

---

O irmão mais velho veio falar sobre dinheiro comigo. Ele é bancário. É meio óbvio. As preocupações com o bem-estar familiar se confundem com as preocupações das metas a serem atingidas em seu banco. É incrível a que ponto o ser humano é capaz de chegar. Só se fala em dinheiro nessa casa. Eu não sei até quando poderei aguentar.
Daí entre um dinheiro e outro, eu pergunto a ele: e aí? Como está essa coisa de eu estar namorando? O meu namorado? Como está? Tudo certo. Ele me diz. Com a minha mãe tá tudo bem. Ela veio falar comigo. (Eu não havia falado nada). E daí a revelação: ontem, meu pai (que também é meu), veio falar alguma coisa comigo, por ter entreouvido minha mãe conversando algo com alguém. E me disse: é o tipo de coisa que eu não posso fazer nada a respeito. Né?
Sim, pai. Nada. Você não pode, não precisa e nem fará nada.
Daí voltamos a falar de dinheiro. E eu tentando identificar a gênese do mal, tentando descobrir quando foi - na nossa história compartilhada - que construir lego com meu irmão poderia se tornar, anos mais tarde, comprar terrenos e construir casas, para vender, pelo desejo apenas de conquistar um singular presente: dinheiro.

---

Desisti de esclarecer do que se trata meu trabalho. Na maioria dos casos, me associam à Rede Globo, como se para vingar o meu trabalho, eu precisasse estar lá. Mesmo sendo televisão e teatro coisas distintas. A primeira é aculturação de massa. A segunda, uma expressão artística.

---

Então começo a me perguntar sobre consistência. Mas vou abrir uma vaga:

---

Curioso poder me remeter a este blog. Eu lembro que o criei em janeiro de 2007, quando minha vida havia anunciado algumas potências e coisas sem nome. E eu criei esse blog para fazer nele alguma imagem que pudesse me sustentar frente às exigências do mundo. Eu queria seguir acreditando que ser eu no mundo era algo possível. Deu nisso.

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Volto sobre a consistência. Eu estou me perguntando bastante sobre isso. Neste instante. Qual é o tipo de consistência que me faz estar aqui, vivo e operante frente a tanta miséria.

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A minha mãe perdeu sua identidade e virou tão somente a Psicanálise. Num grau inda mais agudo, agora eu - o filho - EU - posso me remeter apenas à ela. Não há triângulo edipiano. O triângulo é linha e a linha é soma apenas de 2 pontos: EU e MÃE. Nada foge, a vida fica toda retilínea. Eu choro nela. Ela chora ni mim. Eu rio prela. Ela ri pra mim. Que dor imensa é só poder ver teus olhos, mãe.

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Deu que eu vim passar o natal em casa, neste final de 2013 e início de 2014. Deu que eu sou gay e só agora, faz uns meses, resolvi contar isso a eles. Deu no que deu. Um sorriso contido no centro do estômago e um desejo imenso de colocar o pau sobre a mesa, mesmo que seja para dividir a atenção com o Tender.

---

Essa poesia grosseira não dá conta do que perpassa minha pele. Tenho amor porque fui obrigado a ter amor por eles? Não. Não fui obrigado. Me importo com todos e com cada um. Mas vivemos um tempo de vida muito equivocado. Eu temo o tempo em que vivemos. Ao mesmo tempo que nossa história me fez entender muita coisa sobre quem eu me tornei - e eu estou tudo certo comigo - ao mesmo tempo, eu me afastei tão fundo, tão longe, que agora parece que estou pagando o preço por isso. Não quero ficar longe porque já estou. Quero tentar me aproximar da minha família. Quero tentar me aproximar da minha família. Nem que seja - mentira - para ter motes novos para novas poesias...

---

Natal é época de rasgar embrulhos e comprar presentes errados ao amigo-oculto. Ou seja: pure violence.

---
   

Com que tipo de gesto se vence o preconceito.

Pai
Se tu soubesses o quanto teu discurso
me faz querer morrer
Talvez você viesse a se calar
para todo o sempre.

Pai
Se tu soubesses que a força que te sustenta
é a mesma força
Que extermina povos e cala diferenças
você morreria no lugar de Cristo,

Envergonhado Pai
Se tu cedesses
- uma vez que fosse -
à cor de rosa que mora viva em tua fronte
Se tu cedesses
- só por hoje -
ao rococó do embrulho avermelhado

O mundo saberia que no fundo de tudo isto
o rosa
o vermelho
o vermelho rosado
É mistério do mundo
liberdade plena
E nada mais.

Está Confuso, Pai?

Confuso?

Sua rima orgulhosa deturpa o mundo
e faz sua ignorância - evidente -
ser posta em segundo plano.

Vives, tu, Pai, envergonhoso
Entretido sobre racismos
Fortalecido em grosserias
E ainda mais macho
Sobrevives Tu
firmando abismos
entre você
e toda a sorte de gestos amenos
que possam vir a querer estar contigo.

Eu sou um desses gestos, pai

Gesto menino
Gesto miúdo
Gesto esperto, sábio, maculado já de ameaças solitárias de carinho

Eu sou um desses gestos, pai, Prazer
Sou gesto cansado
Por não ter força
para contradizer
O seu asco repetitivo

Você
Infelizmente
Ou uma
ou outra coisa:

1) És duro por ser em si
A santa ignorância.

2) És duro por ter em si
O orgulho santificado.

Com que gesto, Pai
Eu te ultrapasso e te tiro para um sorriso morno
e um abraço (nem muito) apertado?

Nossas mãos não se encontram porque você ainda é o tipo de ser que fala "viado"
Nossas peles não se esbarram porque você ainda trabalha com distinção entre "raças"
Exceto, é claro, nas suas palavras, o PRETO, que como você sempre me ensinou
desde bem cedinho
PRETO Não é raça.
PRETO Não é nada.

Que horror nosso convívio.

Luto por ele.
Luto por você.
Luto por mim.
Eu sou todo luto.

---

É aí, Pai, que me esforço a tornar importante
É aí por onde escorre sua fraqueza pedindo abrigo
para se discernir e florescer

Mas não, Pai
Seu orgulho de saber mais que as pernas
O seu orgulho te cega
Te afasta
E te torna amigo apenas do Televisor.

Pai, esse é o Televisor
Seu amante
Seu familiar
Seu confidente

Pelo Televisor, nele entretido
Tu olhas os corpos das moças jovens
e eu sei, também dos meninos
O Televisor não te condena
Então a vida se torna a ti
algo impossivelmente possível

O Televisor, pai
é quem te escuta
porque assim como você
É também o Televisor surdo
e brilha
a face
surda
fingindo interesse
em humanidades.

Que gesto, Pai
posso eu fazer
para voltar a ser o filho
que nunca tive oportunidade
de lhe ser?

Estou cansado.

Vencer preconceitos exige leitura
exige escrever mundos
Devo rabiscar as paredes de casa?
O teto?
Curto-circuitar os seus filhos, os Televisores?

Não sei.

E que seja isto
- esta expressão desabida -
a força capaz de administrar
e reendereçar
minha já pseudo-ira

Eu não me importo mais.
Infelizmente, talvez só no leito da morte
- se houver -
eu venha a lhe declamar estas rimas.

---

segunda-feira, 23 de dezembro de 2013

Um comentário.

O melhor do natal passado em casa de mãe
é que eu posso acender todas as velas
e me lacrar em medievo instante.

Dessas postagens amenas.

Tentei. Eu realmente tentei. Não me excedi, mas mesmo assim, doeram-me os dedos e a vista pesou, cansada, sobre as teclas deste teclado.
Antes eu conseguia, mas hoje, está impossível. Os temas amenos não são mais meus amigos. Não consigo mais escrever sobre algumas coisas. Não sei falar do céu, nem mesmo sei dizer de sua tormenta (que durante tanto tempo me seduziu imensamente). Sobre o amor, também já não sei. Porque amo tanto que me falta cuidado para apresentar a coisa com a progressão devida.
Não sei falar da cidade, porque almejo suicídio em cada bueiro que por mim passa. Não posso então mais escrever? É isso mesmo?
Eu realmente tentei. Cessei o cigarro, o café, busquei uma forma ou outro de produzir conflito em meu próprio corpo, mas não sei. Tudo segue a mim indiferente. Eu sigo a tudo inconsistente, nada me fere, nada é capaz de realmente me chamar a atenção.
As dores de continentes imensos inteiros e despedaçados. Nem mesmo isso comove os meus passos. Eu sigo parado, buscando em prosa o verso não domesticado. Buscando em versos a batida de um dia que já está morto e pronto, sem variação.
Meu amor, o que foi que aconteceu quando encontrei em ti meu amor?
Meu amor, o que foi que aconteceu que minha máquina drama emperrou?
Te amo, sim, te amo.
Mas para onde foi toda a minha poesia?
Está contigo?
Onde?
Me diz, por favor, pois corro o risco de ficar desempregado.

---

O Armário do Banheiro

Onde vou esconder minha pornografia
se o armário do banheiro
não existe mais?

Onde vou esconder a cueca suja
caso seja preciso não deixar
pista sobre meu paradeiro?

Onde
se não mais?

Levaram o armário do banheiro. Quis esconder minha escova de dentes nova. Não pude. Voltei ao quarto e o vazio do armário ainda me perturba. Como pode o armário do banheiro ter sido levado?

Fico com a cueca suja no corpo
manifestando à mãe que fiz merda
e a carrego comigo;

Ando, também, oscilando com a pornografia
trazida dentro de mim
escorrendo pelos dedos pênis
pelo umbigo.

Não posso me esconder
eu fiquei grande
e esperava tudo
menos a partida deste meu amigo
O armário do banheiro.

---

um vírgula um dia

talvez tudo seja falta
sobretudo o tudo
talvez
seja feito falta

o que consome a língua
o que raspa a pele
o que enrijece o corpo
os pelos
e esfria o intestino
da barriga

tudo isto talvez
seja falta
sobretudo o tudo
que fica
enquanto tu, meu
amor falta.

então acendo um cigarro
para dar contorno ao tempo
acendo um cigarro
para saber que sim
estou perdendo

mas agora sei
estou vendo
indo
no tempo
me consumindo

eu só não quero o invisível

por mais que ele o seja

tempo
fumaça
tempo
neblina
tempo
satisfaz, não?

porém não posso
não mais
já faz um
vírgula um
dia
não fumo
e espero
ansiosamente
desesperado
a neblina
do seu beijo concreto-selo

espero.

---

O que se acumula

Cruzado o portão de entrada
nada mais o assustaria.
Subiu lento o caminho de pedras
e percebeu cedo
Cresceram-se as minhas pernas.

Mirou a profundeza da piscina
que mais parecia poça qualquer
cheia de afeto
em forma d'água
Nada mais.

Onde estaria o mistério
que não em si mesmo?

As plantas no jardim
O coqueiro
o poço
Tudo tudo havia ficado menor
Tudo pequeno
E ele
adiante
subiu o quintal e estacou frente à porta de entrada.

Eu cresci muito, pensou.
Eu cresci para além,
teve certeza.

Essa parede era mais larga
não mais
O teto mais céu
não hoje
O branco mais cal
não não

Tudo na palma da mão

Esqueceu que tinha crescido foi?
Ele pôde ouvir as maçanetas todas lhe perguntando
Todas
as maçanetas
ansiosas por seu toque.

A casa quis lhe ter suas mãos
por sobre seu corpo
Quis um abraço atento demorado longo
e então
Sentou-se numa cadeira
e mesmo ela
Pareceu cheiro de infância.

Que mistério pode existir agora
faz 10 anos
essa distância?

Eu olho
fecho os olhos
eu toco
fecho o toque
Cerca
Closer
Meu santo espírito
que belo e confuso
é o homem
e seu instinto.

Foste um dia
embora e hoje
De novo
tu voltas
e pronto:

já não é mais a criança que corre

Agora é o adulto que vê
- desnorteado -
os sobrinhos percorrerem
inéditos
os seus caminhos
já idos.

domingo, 22 de dezembro de 2013

Retorno_02

Estou deitado na rede verde da varanda. São 22h17. Cheguei em casa. A vida me surpreende.

.

Acordei 08h e poucos minutos. Estava sozinho dentro do ônibus. Reconheci, através do óculos escuro, a rodoviária de Vassouras, minha cidade de nascença. Desci apressado, carregando malas e procurando um táxi.

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Rua José da Silveira Gomes, bairro Madruga. O taxita veio pelo caminho mais longo. Ele me achou estrangeiro. Eu perguntei não tem taxímetro? Ele me disse que cidade como Vassouras, com menos de 50 mil habitantes, o preço do táxi ainda era fixo.

.

13 reais. Desci. Interfonei. Muito rapidamente, pela fresta do portão de madeira, vi meu pai descendo manco a ladeira. Um abraço rápido e ainda hoje desconfortado. Antecipei o encontro querendo evitar sustos e disse, antes que ele abrisse o portão, eh, pai, cheguei de surpresa.

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Eu vivi meus primeiros 11 anos de vida nesta casa. Mas fazia 10 anos que eu não entrava dentro dela. Hoje, hoje, foi como se ela entrasse dentro de mim, pedindo abrigo e relembrando segredos nossos.

.

Chove. Agora. Meu tamanho faz com que eu me esbarre nas portas, fique apertado nos banheiros e precise iclinar a coluna para lavar o prato. Meus olhos, se se fecham, ainda assim confirmam o detalhe de cada azulejo, cada interruptor, sabemos tudo o que fora um dia e tudo que hoje acabou.

.

Meus sobrinhos correm pela casa como um dia eu fiz.

.

Tenho medo de ser quem eu me tornei e não encontrar espaço. Minha casa é menor do que eu pensava, mas conservo ainda, íntimo, o nosso recíproco cuidado.

Retorno_01

Estou na Rodoviária da cidade do Rio de Janeiro.

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Hoje é domingo dia 22 de dezembro de 2014.

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São 05h36. Meu ônibus parte às 06h com destino a Vassouras.

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Vassouras é minha cidade de nascença.

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Não moro lá desde 2000.

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Propriamente aquilo que me afeta e me traga a atenção e o espírito é o retorno à casa da minha infância. A qual não visito desde aproximadamente o ano de 2000.

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Eu me transformei em alguém. Mas quem sou eu perdido lá, naquele tempo perdido?

sábado, 21 de dezembro de 2013

vértebras

ou tempos?

o que me sustenta
sou eu
ou o tempo
em que estive aqui

mesmo

ao relento?

O ano que por mim passou ---

Rio de Janeiro, 21 de Dezembro de 2013

Este ano de 2013 está chegando ao fim. E eu nunca fui de escrever aqui neste blog sobre a vida propriamente dita, sobre o que corre nas ruas, sobre os dilemas políticos e sociais quiçá econômicos. Sempre escrevi sobre aquilo que passa e passou por mim, apenas o saldo que sobra na ponta dos meus dedos e no centro dos meus olhos. Porém, é tanta coisa acontecendo, foi um ano tão intenso que me senti impelido a pensar - com mais cuidado e atenção - sobre aquilo tudo que passou por mim.

Durante algum tempo da minha vida eu fui alguém que recortava coisas. Jornal, uma frase, uma citação, eu recortava tudo e grampeava, aprisionava num mural, tentava forçar à memória que aceitasse que aqueles recortes todos eram algo importante para mim. Outro dia, porém, abri uma agenda antiga e vi que os grampos do grampeador - aprisionando no papel um pedaço de um tempo passado - haviam se enferrujado e tornado aquele recorte algo impreciso, incapaz de ser lido ou novamente assimilado. Eu tentei, durante muito tempo, prender a vida, mas percebo - faz algum tempo - que quanto mais se impede a vida de seguir seu curso, mais então ela vai encontrando as fissuras para escapar do nosso domínio. Portanto, hoje, eu, inteiro, me deixo passar e deixo, sim, que passem por mim todas as coisas.

Carrego comigo aquilo que comigo quiser ficar. Sem exceder dentes ao mundo, sem querer aprisionar amores nem sentidos nem livros nem mesmo a moeda no bolso. Deixar as coisas passarem é a melhor forma de se descobrir vivo, de se fazer parte desse mundo imenso que também está passando (e levando tudo junto). A poesia, por exemplo, nada mais descartável. Escrevo um poema e me liberto ainda mais a cada verso escrito. Não há vida possível quando se quer muito viver. Pois bem, talvez estas palavras queiram dizer muitas coisas. Eu vou tentar. Passar por tudo o que me passou, mas sem pretensão de aprisionar. Escrevo como quem passa. Eu não vou durar.

A sua diferença do outro

Faz uns dias, vi uma postagem no Facebook que estava compartilhando uma foto. Na foto, um sofá no qual se sentava numa ponta o cantor Gilberto Gil e na outra ponta, oposta a ele, uma menina. Gilberto Gil estava, ao que parece, tocando um violão, viola, algo do gênero. E na outra ponta, a menina olhava para o próprio colo sobre o qual estava um aparelho eletrônico (ao que parece, um mp3 player, ipod, algo do gênero), que ela manuseava com as duas mãos. Do aparelho até os seus ouvidos, dois fones se estendiam e nos davam a leitura de que, enquanto o Gilberto Gil tocava, a menina ouvia alguma música.

Não sei se a descrição acima dá conta da simplicidade da imagem. Porém, essa mesma foto - compartilhada excessivas vezes por inúmeras pessoas - trazia à tona uma série de comentários que, em suma, manifestavam um ódio à menina, por julgarem que não pode existir a possibilidade de, estando lado a lado com o cantor da foto, cantor este munido de um instrumento musical, não pode existir a possibilidade de se fazer outra coisa no mundo que não seja ouvi-lo.

E então eu fui um dos que comentaram a foto. Escrevi: deixem a menina ouvir o que ela quiser. E depois, pensando, percebi como a foto assim jogada fora de seu contexto original pode significar muita coisa, inclusive aquilo que possivelmente nem estava acontecendo no momento em que a foto foi tirada. Escrevo para lembrar do espanto meu com a nossa intolerância. Com que cuidado? Com que cuidado e educação se vive em rede, em sociedade?

Eu não consigo acreditar que a menina da foto devesse ouvir Gilberto. (Eu não vou nem entrar nas possibilidades daquilo que realmente estava acontecendo no momento da foto. Vamos aceitar que era isso: ele tocando uma música e ela ouvindo outra). Eu não posso aceitar que ela precise ser diminuída, desrespeitada, apenas por não estar fazendo aquilo que deveria ser feito. Mas o que deveria ser feito? Ele toca e eu escuto? Assim? Obrigatoriamente? Não se pode agir de outra forma? Não se pode não querer ouvi-lo?

É por meio desse tipo de situação boba e trivial, que se repete inúmeras vezes por dia, que o ser humano se manifesta tomado por uma preguiça tenaz de transformar seus hábitos de mundo, seus vícios e sua forma de se relacionar consigo mesmo e com o outro. O que te faz menosprezar o outro? Quer seu discurso seja lindo ou não, o que te faz assassinar o colega ao lado só porque ele não gosta daquilo que você ama?

O simbólico custa caro ou 1989

Eu nasci em 1987. Muitos anos depois, no colégio, fui descobrir que em 1989 um muro, que havia sido construído para dividir a Alemanha Ocidental da parte Oriental, foi derrubado. A queda do Muro de Berlim, tal como aprendi na escola, simbolizou o fim da Guerra Fria. A Guerra Fria foi uma luta a versus b. Capitalismo versus Socialismo. Estados Unidos da América (EUA) versus União das Repúblicas Socialistas Soviéticas (URSS). Preto versus Branco. Homem versus Mulher. Bom versus Ruim. Belo versus Feio. Quente versus Frio. Requeijão versus Manteiga. Quer dizer: eu não estou preocupado com a verdade ou a falta dela nisso que aqui escrevo, eu não devo satisfação às Enciclopédias, mas eu nasci num mundo maniqueísta e incapaz de algum comum entre os homens. Dois anos depois do meu nascimento, a efetiva e simbólica queda do Muro de Berlim me brindou com a possibilidade de me misturar ao outro. O Muro de Berlim disse para mim: não precisa mais desse treco de pular cerca. Fique tranquilo. Estamos entre humanos. E o que eu faço agora?

Vejo que o tempo passou. É com pavor que penso que estamos começando o ano de 2014. Estamos nos aproximando quase do meio da segunda década do século XXI. Quer dizer: até quando vamos arrastar adiante aquilo que não condiz mais aos desejos de nosso tempo? Até quando vamos domar a febre de nossa época com remédio? Ninguém vai se embriagar com esse calor? Vai ser uma era de ar-condicionado? Como podemos frear a boca e falar com o peito? Com a pele? Com o coração? Até quando vamos soltar nossa incompreensão e ignorância como tiro e não como pergunta? Quando vamos pedir ajuda uns aos outros para dar conta daquilo que não conseguimos tocar?

Perguntas bobas. Mal formuladas. Mas a Guerra Fria segue operante em nosso mundo. Ela é a forma fácil de produzir perdedores. E de vender fantasmagorias de pódios virtuosos e virtuais. Quer dizer, é fácil, prestem atenção: só existem sempre essas duas opções: ou vai ou racha. Se você não pode ir, você racha. Se você racha, é porque não foi. Simples, né? Quem dera a vida fosse essa novela globulosa.

Vivemos um tempo de deslumbre. Em outras palavras, tempo de medo pós algum deslumbre que tivemos: de que o mundo pudesse ser meu e que dele eu fosse o dono e vencedor. Tempos encharcados de deslumbridades, tempo capa de revista, tempo raso, cova, tudo plano feito outdoor. O nosso milênio traz do escuro para à luz alguma diferença que durante séculos vinha sendo enclausurada. Há muita diferença dentro do queijo e do presunto que nunca foi dita, nunca foi desbravada. Cabe num só pênis mais fábulas do que na Bíblia inteira. Numa vagina, há mais bruxaria que em toda a série Harry Potter (o segundo livro mais vendido na Inglaterra, depois da Bíblia). Há muito mais que homem e mulher nesse mundo. Há mais inclusive do que só calor e frio. Por favor, até quando vamos lidar com o mundo e com os outros que nos rodeiam como se tudo e todos estivessem precisando ser resolvidos? Até quando vamos ficar nesse vício insuportável de voltar às caixas, às categorias, aos gabaritos?

Processo colaborativo

Crise de autoria e, por extensão, de representação. Eu quero dizer: como vamos abarcar a diferença que ocupou as ruas durante vários meses deste ano? Como vamos dizer que partido, que causa, qual motivo? Se cessarmos o esforço de explicar o instante, talvez ele passe por nós e deixe o seu eco profundo ecoando dentro de nós feito arrepios constantes. Mas se quisermos firmar na capa do jornal, talvez estejamos perdendo o instante e o convertendo em tristeza digitalizada (não ouvida nem posta no colo). A nossa noção de diferença é muito segregadora, aparthaida.

Diferença não precisa ser o estranho do qual eu me afasto, o estranho que eu repudio, não precisa ser - a diferença - aquilo que está errado (porque o certo sou eu, porque o certo está comigo). Quando foi que aprendemos que as coisas distintas como se manifestam não poderiam coexistir? Que dominação é essa? Neste instante eu volto a ser a primeira pessoa deste plural: nós. Coloco-me junto para, ao me maltratar, fazer o mesmo com você. Eu também estou sobrevivido nestas questões. Tentando mais que vivendo. Eu estou tentando. Por isso me junto ao rebanho dos gays homofóbicos, dos de esquerda capitalista, dos skinheads e dos que usam dreds. Eu me junto aos negros racistas, aos evangélicos versus evangelistas. Eu converso com o letrado que oprime o sem letra. E também com aquele que, por não ter podido estudar, aprendeu a chamar quem estuda de recalcado. Eu me junto à galera da novela e aos seres da rua (eu tento). Eu me junto a todos e se pudesse - por um instante - quando estivéssemos todos reunidos, eu faria descer do céu, sobre todos nós, o silêncio da chuva: eu iria gostar de ver no fundo dos olhos úmidos escuros que não é sobre isso o que é a vida.

Então, eu me pergunto, até quando eu vou ser no mundo aquilo que não me interessa mais ser? Eu me pergunto: em qual medida ínfima eu posso me colar no meu desejo e sê-lo inteiro (porque ser o desejo é se ser). Em qual medida eu posso andar desejo? Ser desejo? Ser? Nietzsche nos pede que sejamos aquilo que somos. Ninguém melhor que si para se (permitir) ser.

À guisa de conclusão


Não vou continuar. É mais fundo do que se anuncia e eu estou cansado, cansado e imensamente cansado. Eu começo escrevendo para mim, depois me destino a você, depois volto a mim e, por fim, transformo tudo aqui em filho. Neste espaço eu me preservo parte do mundo e deixo que passe tudo (até aquilo que eu condeno ou venha a não mais ser dono). É só que eu estou assustado com o mundo, com a possibilidade efetiva do eterno retorno voltar e firmar as mesmas tragédias de sempre (aquelas que já estudamos na escola). Diria Drummond que vinte anos é um grande tempo, que vinte anos modela qualquer imagem. E eu tenho 26 anos e penso - convicto - eu estou sendo quem eu gostaria de ser.

Eu não preciso te matar para dizer que para mim não deveria existir sol. Eu não preciso assassinar ninguém para compartilhar meu desejo, meu desenho de mundo. Eu preciso aprender a te ouvir e, mesmo não te aceitando, saber que você não é doença, mas sim, saldo deste mundo (que nós criamos juntos). Não, não e não. Não estou falando do sorriso no rosto e de aceitar tudo e ir engolindo o que lançam a mim e a ti. Não vamos duvidar de alguma esperteza nossa. Basta olhar. Olhar fundo e demoradamente. Está ali, dentro de cada olho, o coração da questão que te chama atenção.

A embriaguez de nosso tempo é o cansaço. Andamos cansados, acordamos cansados, amamos cansados e criamos cansadamente. Construímos um mundo que está cansado de buscar solução para aquilo que precisa ser resolvido. Eu não sei. Eu nem estou bêbado, nem drogado, não fiz nada exceto ter deixado o dia escorrer sobre meus olhos mãos dedos pelos e braços. Meus cabelos chegaram em casa pesados. Eu olhei para trás e imaginei o que poderia haver sobre mim que me fizesse os ombros assim tão cabisbaixos. Eu não vou retornar aos parágrafos acima para dar sentido e esconder minhas ignorâncias. Eu não tenho medo da sua leitura sobre os meus fatos, porque eu mudo todos os dias, a minha consistência eu devo ao tempo e não ao corpo. O tempo carrega de mim o que ele quiser e eu não fico, eu apenas passo, passo, eu vivo no meio disso. Eu vivo, no meio, disso. Eu estou aqui.

De passagem. Apesar de um pouco enjoado.

E então a homeostase

Só o amor é capaz de explicar como o corpo se resolve inteiro quando se está a amar. De um súbito para outro minha vida mudou. Num soluço. Inteiro e não muito breve, fiquei vendo os silêncios e descobrindo cobertores de longos anos sobre meu próprio peito. Senti fome que ainda agora sinto. Senti medo. Medo desse abismo fundo que é reconhecer o clichê mais lindo: amar alguém que tem por nome "meu amor". E então, me encontrei na maior cilada: e se eu perder tudo isso? E o que fazer se o meu amor for embora e me deixar feito pinto no lixo?

Dobrei uma esquina, mexi nos cabelos, escrevi oitenta poemas e cheguei a uma resposta: passa por mim, amor, que aquilo seu que quiser morar em mim, no tempo que for, eu vou regar.

Como diz Walter Benjamim, a vida fica muito mais simples quando avaliamos a possibilidade das coisas todas serem destruídas. Hoje eu não sobro em meio a muita coisa; não há muita coisa mesmo. A vida não é shopping (por mais que nos digam o contrário). Hoje eu poderia - repleto - pôr fim a minha vida. E estaria tudo certo. Como tem que ser. Chega um momento em que o corpo escreve apenas o próprio desejo. Chega um momento, tal qual este ano fez chegar em mim, em que os sonhos todos bailaram vivos à luz dos dias e em meio à luz das noites. Deitei e dormi. Acordei e fui. Vivi. Então, percebo, nada em mim resta mais enclausurado: o medo da morte, o medo da saudade, da distância, o medo de sentir medo e do amor; é tudo trailer de filme drama antecipado.

Deixa a vida morrer. Ela precisa disso. Deixa o amor passar, deixa a cama tatuando seu corpo nela até ter que se providenciar outra. Deixemos os rumos serem e se desdizerem, no tempo em que quiserem. Deixa a coisa toda porque nada pode ficar até o fim, nem mesmo o próprio fim. Que pretensão é essa que nos faz querer durar?

---

quinta-feira, 19 de dezembro de 2013

Eu estava contando ao poeta Carlos Drummond de Andrade aquilo que aconteceu em nosso mundo desde o falecimento dele, em 1987 (mesmo ano em que nasci), até o presente momento.


para a mãe, neste natal


silogismo do terror:

eu sou eu com barba
minha mãe odeia minha barba
logo
minha mãe me odeia?

---

Sobre mim, sobre eu, sobre quem quer que eu seja

Não estou conseguindo escrever.

Consigo pontuar acentos e vírgulas
melhor que antes
Mas agora, se me vejo tentando escrever
me soa pequeno
menor que o próprio tamanho.

Sim, eu sei
Faz meses estou amando
apaixonado
completamente tomado
Eu sei, eu sei
eu já escrevi sobre isso
E mesmo sem escrever agora
(sobre o amor)
O amor se conserva quente
aqui
ao meu lado.

Então reclamo do quê?

Reclamo da ousadia das sílabas
paralisada.
Reclamo das rimas cansadas
das metáforas de merda
das canções inacabadas.

Não quero acreditar que poesia só exista quando a alma é solitária.

Agora, que te conheço
e te desejo
por todo o instante
Não haveria poesia capaz
de iluminar meu instante
aqui
de novo
neste mundo
Pulsando?

Não. Eu não vou matar nosso amor para te escrever versos.

Não. Não mesmo. Foda-se tudo,
foda-se o resto.

O que fica é meu e seu
é nosso
E realmente o que há fora disso
não me chama
não me atrai.

Fico, te olhando nos olhos
e tentando fazer poesia
em movimento
Sei lá,
vai que você cai no verso do meu sorriso ameno
Vai que, tu acreditas na metáfora enovelada dos meus cabelos lisos
Vai que, eu não sei,
eu consigo te prender aqui comigo
pela simples literalidade de um encontro como o nosso

sem enredo
sem rodeios
sem flamejantes desdobramentos

Te amo em simplicidade.

Te amo assim desse jeito,
curto
grosso
puto
tosco

Todo humano
Demasiadamente
Amor.

Aresta

Sentado estava
de novo hoje
sobre a cadeira
de braços.

Olhou para o lado
(não sei dizer qual deles
são tantos)
mas olhou
e se viu no futuro
rastejando.

Fez um soluço secreto
para dentro
uma espécie
sem jorro
de vômito.

Quis ter pena de si mesmo
mas não conseguiu,
é que na área de serviço
de sua casa
a máquina de lavar roupas
deu um grito
e o trouxe de volta
à ordem
das coisas do dia-a-dia.

Pensou, então,
que beleza é essa
de não poder
- repetidas vezes -
escrever sua poesia.

Sentiu orgulho de si mesmo.

Por se achar
somente humano.

Sujo
e carente de banho.

Não houve mais nada
naquela noite.

Esticou as roupas coloridas no varal.
Viu a chuva caindo lenta
lá fora.

E pensou:
amanhã
o sol que vier
terá de secar tudo isso
Porque eu viajo em dois dias.

Que sem graça.
Que vida.

quarta-feira, 11 de dezembro de 2013

para que fique o ano

quem assiste ao jornal nacional passa a entender que manifestação é crime, que manifestante é bandido e que a corrupção é uma qualidade natural da nossa realidade, contra a qual não se deve lutar. quero curto-circuitar televisores para ver se se abrem alguns olhos. nem que seja por susto.

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nunca imaginei que pudesse estar numa mesa de bar com amigos discutindo a forma mais criativa de protestar nas ruas.


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uma música toca bem alto, os atores montam e desmontam o cenário, escondendo dentro do som da música o barulho de seus gestos. o que acontece agora no maracanã é exatamente isso: gols e gritos tocam lá dentro enquanto uma sinfonia de tiros e socos explode aqui fora. e você vai ouvir o quê? só aquilo que te interessa? uma hora ou outra, terás que sair do maracanã e pisar sobre cabeças já pisoteadas. quer brincar de ser cego, então aguenta os trancos. porque o metro quadrado no rio está exorbitante. é impossível andar sem esbarrar na vida do outro.


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no próximo ano, a Rede Globo poderia lançar um reality show chamado BBB >>> BERTOLD BRECHT BRASIL <<< no qual as pessoas são obrigadas a ler e refletir, AO VIVO, sobre a obra desse cara.


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é curioso o que essa situação da jornada mundial da juventude nos revela: entre piadas e comentários ácidos, repudiamos aqueles que nos diferem. é curioso porque, ao mesmo tempo, bradamos e pregamos contra inúmeros que também estão nos repudiando, justamente por sermos diferentes. justamente porque escrevemos e lemos o mundo de forma outra.

quando foi que entendemos que para ser a si mesmo seria preciso impedir que o outro fosse o que ele é?
quando foi que para ser um, se tornou necessário des_ser o outro?
tudo isso é confusamente curioso.

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Sentou-se. Solitário, como tantas outras vezes. Ligou a máquina de fazer sonhos e viu, refletido em seus olhos, a luz da tela lhe reacendendo por dentro. Completamente tragado. Fazia dias o único exercício vital era esse: desvelar em verbos e adjetivos o tamanho imenso e agigantado tal qual se manifestava o próprio íntimo. Persistiu inerte mirando o abstrato consumindo-se em palavra. Não ia mais escrever. Agora seria olho no olho. Ele olhando fundo no olho de cada palavra.


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Cerca de mil pessoas morreram hoje na Síria. Onde é a Síria? Morreram por terem sido alvos de armas químicas. Quem faz esse tipo de coisa? Eu acabei de ver um vídeo, eu vi dezenas de crianças jogadas ao chão de uma sala, com o corpo duro, os pulmões inflados, mortas na procura por ar. Eu escrevendo sobre amor, sobre o ar que me falta por estar te amando e agora esse vídeo, me dizendo que não. Quenão é nada disso. Eu tenho estômago? Eu já tirei o curativo do dedo e estou escrevendo com sangue na ponta de cada letra. Eu, às vezes, me confundo com a ira que sinto de algumas coisas. Eu escrevo e choro e isso me deixa puto, porque o meu desejo era o de virar outra coisa, era o de sumir e dar jeito em ao menos uma dessas crianças. Por que me dói tanto ver o ser humano ser judiado? Todos devem sentir isso, mas eu sinto e quando sinto, eu me sinto tomado. Eu me anulo e meu corpo inteiro regurgita, como se lutasse sozinho contra todos os cânceres em estado avançado. E como se os vencesse. Dói tudo, dói tudo. As lágrimas não descem, as palavras não cessam, o mundo não para. Eu queria ter-me dado em troca daquelas crianças, daqueles homens e senhores. Eu queria ter-me usado para impedir mais uma atrocidade, dessas que nascem e renascem copiosamente. Eu ainda estou vivo querendo fazer do meu trabalho alguma coisa que apazigue o mundo. Eu não sei como faz para amanhecer outro tipo de mundo, mas eu vou continuar tentando.


---


apenas para lembrar: em dezembro de 1993, este rapaz da foto - Brandon Teena - morreu, após ter sido espancado e estuprado por dois outros homens, numa cidade no interior dos estados unidos.





quarta-feira, 4 de dezembro de 2013

Romance

Eis a forma mais livre para conseguir existir.

Se um dia eu me sentir só, como hoje estou me sentindo. Se um dia eu me sentir só e entristecido, como hoje, mas não tiver força para acabar comigo. Se eu achar que não se trata de morrer e, ainda assim, continuar triste e achando o mundo vago. E se estiver vagando lento em meio ao vento trazido por ônibus algum que me cruza em alta velocidade. Se um dia assim como hoje isso me acontecer,

Eu pego nos meus braços todos os romances que comprei e nunca ousei ler e me tiro daqui, indo com os meus 600 reais em conta bancária rumo à casa da minha infância, no vale.

Existe algo difícil de explicar. E a vida ainda me encanta pelo imprevisível que a ela me conecta.

O que eu quero te falar, talvez você não queira ouvir. Existe algo dentro de você.

Mas hoje, meus olhos namoram apenas romances de outros e todos os tempos.

Eu sobrevivo. Juro que não vou morrer. E isso é por mim, não necessariamente por você.

---

terça-feira, 3 de dezembro de 2013

quando eu não estou com você

sabe o que acontece?

os versos desta casa
saem para passear.

são meus filhos, eu já disse
lendo árvores (tais quais seus olhos)
e escrevendo filhos
(esta poesia toda, a ti, apaixonada).

acontece isso quando não estou ao seu lado
as rimas te procuram, autônomas
e eu quase sinto que você as revolve
na tentativa de se achar
aqui
protegido.

se a rima virar esse espaço esconderijo
onde pudermos nos guardar
da velocidade que assola os dias
então

eu vou continuar escrevendo, certo?

não quero mais nada
quando eu não estou com você

por isso, filhos meus
tratem de se mexer
para ver se fazem do pai
outra coisa
que não espera
de novo e repetidas vezes
ansiosa pelo teu abraço
ainda morno
aqui
na memória de uma manhã
que amanhã
será transformada em ontem.

amor

não posso mais te escrever poesias. estou redundante. não sei mais como dizer o mesmo de outra forma. tudo termina em amor. em amor. em você. em amor. me entende? queria ter criatividade para ousar novos versos, novas palavras, sabe? intrigas, tramas, narrativas... qualquer coisa, menos o que já sabemos. menos o que descobrimos juntos.
tenho medo de ficar nisso? não. não é isso. é só que você ultrapassa a medida de tudo (inventando e ainda em gestação).
eu não estou dando conta, portanto, faz de conta que isso é só um trecho ruim de um livro abandonado na gaveta. finja que todos os vocês, depois de você, não são você. e que amor é algo tipo coisa comum, coisa boba, tão qual planta, sol, carro, mesa... enfim...
(amanhã eu tento de novo).


fobia

mês estranho
que começa lento
apesar
de esfomeado
as coisas
todas
hão de se encaixar
assim como sonhos
vão se tornando
passo a passo
mais o que devem ser

não é poema
não poesia
nada
nada
é só pedido meu
a mim mesmo

que consiga
domar o tempo
e firmar
neste espaço

o propósito dessa coisa toda
que muitos homens
teimam em chamar
de vida.

oh!

domingo, 24 de novembro de 2013

desgraçado.

pensa tu, o que de nós?
rima improvável
desconcertada alegria.
pensa, tu, o que da gente humana?
sabes, tu, quanto de nossa azia?
fermenta
sob o sol
se procria
mas e a sede
nossa
que não cessa
quando então
virás tu, inteira
provar a todos nós
felizes e esfomeados
que o buraco
onde tens raíz
é mais fundo, oh, pétala
é mais buraco
do que embaixo
hein?
quando virá tu
passar-nos a mão em seda
e provar a nós
gente humana
que a desgraça
não como o sol
não é passageira
hein?
eu te chamo.
                                                           
                                                     
                                           
                                 
                     
           
.
.
.
.
.
.
.
.


firmeza.


durante muitos dias desceste
sem fim rumo a coisa
alguma

hoje se te olho
não é por pena
apesar da azia

se hoje te olho é por apenas
esforço anti-lobotomia

não se esqueça do
beijo que não
veio.

realidade

não
quebraram o espelho
não fui eu
mesmo assim
o sono veio

pesadelo
não era o que pensava
volta e meia
hoje
de novo
madrugada

desvia
desenquadra
olha a esquina escura
e se cale
não foi nada

durma triste
inconsistente
a pobreza
de algum espírito
deitará
ao seu lado
paciente

frio
quentura
o fim da semana
antecipa a
loucura

problema
é a fome
é a distância
aquilo que some

agora
só há piedade
e o desejo vago
de ver de novo
isso que nomearam
realidade.

segunda-feira, 11 de novembro de 2013

Caipiroska

Ah
Lamento
Seguido
Constante
Escrevo
Dedos
Cara
Antes
Não
Gostam
Ai
Dentro
Deve
Voucher
Manhã
Deve
Repete
Gato
Gata
Fome
Panqueca
Licença
Ed
Iraci
Henrique
Kelly
Desculpa
Não
Retrocesso
Bossa
Roll
Parte
Show
Coisa
Amor
Amor
Oh, meu amor
Oh, meu amor

As palavras que aqui se falam
Não me fazem te encontrar

Qurpero voltar
Eu
Quero
Voltar
Até o fundo doce
De seus abraços
Até o cheiro ocre
De teus amassos.

Trilha

Fraquejo

Mas me olham

Então fraquejo inda mais

Para afastar dúvidas
Do meu esmorecimento.

Sim, estou morto
De cansaço

Morto por ter que explicar
O óbvio
Que se esconde
quando longe
E se revela
quando ao teu lado.

Fim.

sábado, 9 de novembro de 2013

canonizar.




Sobre estar amarrado.

Em tantas coisas eu perduro. Sobrevivo sobre tantos e sobre tantos pequenos detalhes. Por vezes, tal como agora, eu me pergunto se não estou por demais amarrado. E um desejo de liberdade vira, de imediato, apenas mais uma amarração em minha vida.
Desde quando querer ser livre não já se tornou rima repetitiva? O que é ser livre se liberdade mesmo é estar morto?
Não é nada, meu amor.
Essas coisas que escrevo afastam o sono e colocam a coluna vertebral - que seja por alguns minutos - um pouco mais ereta, desperta. Essas coisas. De quem está cansado faz tempo de estar sempre tão cansado. Meus dedos transitam livres sobre o teclado, mas, vejam, não são livres porque poderiam transitar não apenas sobre estas letras, mas, sobretudo, por sobre o teu corpo.
Seu corpo que eu cada vez mais sei inteiro, sei por toque, por beijo, boca, lábios e saliva. E põe saliva nisso. Põe o que mais for, corpo teu é sempre mistério que se recria, tão logo eu adentre um esconderijo travestido de surpresa.
Nu umbigo, sobrevivo impaciente frente a tua presente presença.
Se estou amarrado a você, meu amor?
Sim, estou.
Mas também tenha eu cá minhas outras amarrações: amo o cigarro, amo o álcool, amo meu trabalho. Mas não estou dando conta de tanto amor. Você veio, você chegou, e então maior parte da minha capacidade de amar voltou-se para ti. E meu mundo exterior ficou ressentido.
Minha mãe chora saudade. Minha saúde pede a mim mesmo que eu possa me dar abrigo. E eu nem vejo. Porque estar vivo é só agora. Momento exato no qual eu te amo e isso me chega, incessante, apenas como fato. Fardo. Peso. Pesado. Que me firma no chão e faz do planeta Terra a minha casa, o lugar onde gostaria de estar, algo novo e possível.
Sua revolução é você mesmo, aqui ao meu lado.
Sua inteligência está na beira dos seus olhos e pisca a mim, sempre que te encaro.
Faltam quantos dias? 16? É muito, não?
É pouco também, mas assusta.
Como posso te amar tanto a ponto de querer dormir 384 horas seguidas? E acordar com seu sorriso me pegando de leve e me chamando, de volta, à cama.
São só palavras. Meus olhos quase já fecham. Há tanto a amar por aqui. Meu corpo, minha casa, meu tempo e meu espaço. Quero amar meu trabalho que está ciumento, que está ficando louco, teso, tresloucado.
Você é perfeito e isso é inacreditável. Porque até o que não me serve - em você - até isso, mesmo assim, me revela quem tu és e quem - por conta disso - eu desejo e preciso ser.
Acordo, meu amigo.
Estamos amando como se o amor pudesse ser isso. E é.
Do nosso jeito.
Eu te amo. E - repetidas vezes - não tenho mais o que lhe dizer.

Mas vou continuar tentando.

sexta-feira, 8 de novembro de 2013

pouco, muito pouco

sobrevive o corpo
desapegando-se
em escalas grandiosas
de todo apego
que possa
interpolar o caminho

caminha-se para quê?

mas vai
o corpo
sobre lodo
logo o corpo
inteiro
e cosido
nos pontos
dolorosos

para quê?

um fiapo de energia
se agiganta
não a ponto de virar forca

um fiapo se agiganta
e vira luz tênue
que pede abrigo
no si mesmo.

queria ficar parado
durante tantos dias
esperando o seu sorriso
colado
agora

num
beijo
meu.

quarta-feira, 6 de novembro de 2013

Como faz para ser aquilo que se é (mas ainda lá dentro)?

Ada, Flávia, Helena e Nat,

Não foi aleatório. Talvez pela primeira vez não tenha sido. Escolhi alguma música que me cheirasse à transformação. Sinto ser exatamente isto o que eu preciso. Agora.
Dia longo. É curioso que esteja chovendo tanto e sem parar, desde cedo.
Meu par de tênis - recém-comprado - já está com a sola gasta e, por conta disso, cheguei em casa agora, com os pés, meias e alma lavada. Lavagem da rua.
Eu sou (quase todo) mundo.

Ouvi hoje muita coisa sobre quem eu sou. Sobre quem eu tenho sido.

Fiquei triste. Chateado. Ferido. Mas a vida não é drama. Não. É só que fico pensando sobre como fazer diferença, como fazer diferente, como me tornar aquilo que eu sei que sou, mas que os outros - ao meu redor - ainda não conseguiram ver.

Uma pausa? Não. Sem pausas, por favor. Falem, sigam falando. Minhas amigas, do peito e de ofício: que triste é saber que a minha força seca o seu impulso. Que triste é ouvir de vocês que lhes dá medo quando eu venho, sempre enfático, dizer sobre aquilo que penso, dizer sobre aquilo que sinto.

Eu esperava qualquer coisa, menos isto. Mesmo sem esperar, eu esperava outra coisa.

Não há drama. O drama é interno e escorre por todo o meu corpo. Eu não sei resolver. Eu ainda não sei sequer o que dizer, como proceder, não sei se saberei resolver, eu não sei nada. E voltei para casa, ressentido.

A minha ira é essa. Não poder domar um pouco do que sou. Os passos são meus, e mesmo que eu desvie das pedras ou das poças, chega um momento em que os pés andam sozinhos e o que dita o caminho é outra coisa, sem nome, sem explicação: algo inominável.

Estou chateado.

Não contigo, não com vocês, mas tão somente comigo. Com essa força tão fraca que me toma e atropela os meus ouvidos. Eu digo que escuto. Eu digo que vejo. Eu digo que recebo; mas hoje fui por vocês informado de que não. De que não é bem assim como eu me revelo.

De que esse projeto de filho, esse manifesto da diferença, talvez sobreviva apenas em mim, nas minhas poesias e na minha presença. Porque quando eu vou embora, talvez vocês tramem uma solução que possa me dar jeito. Eu não sou quem eu acho que sou.

Dilema. Sem drama. Estou ouvindo música cheirando à revolução. Não é para me sentir fraco e diminuído, não é música para fazer do meu corpo tela plana de televisão.

Nunca saltei tantas linhas após escrever frases tão curtas. Eu estou tentando arejar alguma coisa. Eu preciso aceitar que alguma ausência minha pode nos ser profícua.

Cobranças? Ouvi. E me sinto tão doado, tão esforçado, tão firme, que me estranha a afirmação ter vindo assim tão certa, tão categórica.

Se há alguma confiança em mim que tenha sido tenaz durante todo este tempo, foi uma só: a de que vocês são tão capazes quanto eu me sinto ser. Então me estranha que não esteja sendo em comunhão aquilo que eu achei - sempre - ter sido.

Não tenho rumo. Vou escrever um pouco mais para ver se cravo em mim esse desassossego recém-ouvido.

Como se escreve esse enjoo?
Como se dá conta do desejo urgente de ser, que seja por uma semana, sumiço de si? Abandono de tudo isso?

Acreditei tão forte em nossa poesia que - vocês me dizem - fiquei bruto. Burro. Torpe. Esses sinônimos que enganam (só porque são usuais e soam bonitos de serem ditos).

Uma pena - hoje - foi descobrir tudo isso.

Não há drama. Eu escrevo para não esquecer (mesmo sabendo que as palavras nos servem para esquecer).

Cogito soluções (sim, às vezes, solucionar é sim possibilitar que o mundo continue se descobrindo). Cogito que eu deva atuar o meu projeto (que segue vindo, que segue se tornando - sobre mim - e ante aos olhos teus). Cogito atuar não mais quem eu sou, mas quem eu gostaria de - já faz tempo - ter me tornado.

Não vou indicar que leiam isso que escrevo. Está aqui e é mais para mim do que propriamente para vocês.

É só isso. Interpretar a si mesmo, daqui para a frente, para ver se o personagem que quero ser se cola de vez em mim e me toma de mim mesmo, revelando-me outros abismos.

Cansei de mim mesmo e estou morrendo, lento, feito plástico que derrete fora do sol, que derrete sobre a mesa. Eu estou morrendo (em sonho e em vida). Eu estou partindo, lento, tão devagar, que ainda tenho a sensação de estar vivo. Deve ser tudo uma mentira.

Que cansaço chegar até aqui.

Quanta coisa conquistada, mas não o si mesmo.

Eu estou aqui. Começando uma ficção de mim mesmo, para ver se a vida se ajeita um pouco mais.

Diogo ---

quarta-feira, 30 de outubro de 2013

Improdutivo

Virtual quimera
escrevo poemas
a ti
lindos,

Virtual jogo
translúcido
transparente
impossível.

Carrego os dias
na ponta dos olhos
na ponta dos olhos
dos pés.

Nada aqui sobrevive

Exceto desejos
(ansiosos, sempre)
ansiosos.

Forma pequena
recrudescimento
da narrativa.

Perdeu-se alguma coisa
e a falta
foi a primeira coisa
Perdida.

Não sinto nada.
Só você.
Que me cruza
em pensamento
em esquinas sonhadas
em memórias ainda
frescas
e sobre a vista
Alojadas,

Saldo

Completei mais um ano de vida.

Às vezes o aniversário demora a funcionar, você sabia?

Sinto o meu novo ano
agindo sobre mim
com força impiedosa,

Vago em meio às ruas
vejo fundo as pessoas
e tudo assim:

no risco exato
de se revelar
em vasta
complexidão.

Eu vejo; não,
não
Não.

Não sou melhor do que antes.

É só que a graça do mundo ficou ainda mais
e mais
Distante.

Por isso um amor,
neste momento.

Por isso um amor.

Hey Now

End of this month
I am here
working fully
working alone

Guess what?

I am working for the future
working to make ways
to love you
in time & space.

Hey, guy
It is not easy

Hey now
It is amazing.

segunda-feira, 21 de outubro de 2013

Dobradura

Venta
E tanto
Que o tempo voa
E me desabandono

Ontem
Hoje vejo
Ontem com pés sobre a areia
Dobrei a coluna
E cobri a envergadura
de minha vista
Apenas com o tamanho do céu

Pensei em ti, meu amor
Pensei em nosso abraço
Nessa coisa toda
De amor rima céu
De novo
Redundante
Louco, movo-me
na espreita de teu suor

Venta tanto aqui em Recife
E eu querendo-me fazer
de ave
Para pegar carona
E amanhecer na ponta da sua bochecha
Amassada

Perguntaram-me hoje
É seu namorado?

E eu respondi em sorriso
Por ter sido revelado

Não há mistérios
Fatos são fatos.

terça-feira, 8 de outubro de 2013

23

se eu me desse confiança
estaria chorando
sobre a louça suja
estaria sonhando
entre o edredon
estaria eu perdido
adiando compromissos
estaria eu fora de mim
te procurando

mas não
não, né
acho que não
não
definitivamente
não

amor
essa coisa
esse nome
essa puxada
constante
sutil
estrondosa
delicada
essa ação
esse músculo
involuntário
que tem seu nome
que cheira seu cheiro
que me consome
isso
essa coisa
esse mundo

isso já está dado
não há nada mais
que possa ser feito

nem freio
nem futuro
é tudo presente

portanto,
sem lamúrias, ok?
sem choramingas, certo?
sem mimimi, confere?

o amor acordou sobre a cama
repetidas vezes
já é tempo de reconhecer
que alguns impossíveis
têm sim
plena condição
de acontecer
todo o dia
e de novo
novamente
entre os segundos
entre os espaços
em suma,
em nossa vida.

é isso
eu acho que é isso
é isso
certo
tudo certo
tudo
certo.

domingo, 6 de outubro de 2013

Tempo

Não faz sentido
Escrever-te poesias
Enquanto tu, poesia mor
Escorre sua presença
Ante ao toque ansioso
Da minha vista,

Fica.

Fica.

Fica, em negrito.
 

As coisas todas

Aqui estou eu, meu amor
Encontrado entre tantas coisas
Suas,

Pelos cômodos da sua casa
Na borda de uma ou duas canecas
Na cor azul escuro
de tuas xícaras

Cá estou eu
Tranquilo e exasperado
Fazendo parte de um mundo outro
que como mundo novo (para mim)
Apenas me solicita uma coisa:

cuidado.

Hoje é domingo
Amanhã será segunda
Depois terça, sexta, quarta, sábado
E finalmente
Quinta,

quando de novo estaremos juntos
juntando ainda mais esse mar imenso
de coisas nossas (coisas minhas + coisas suas)

Percebe?

Estamos ligando os pontos
Com fome e com sono
Atentos e dispersos, estamos firmando o jogo
e as regras pululam querendo ser reconhecidas

Quais são as bases de nossa premissa?

Vamos encontrando
Por entre a roupa suja
Por sobre as cinzas esvoaçadas
Encontraremos o rumo
o fio que assegura o destino
Não todo traçado
dessa ousadia recém começada

Pausa
Pausa para nada
Volto ao dia
Buscando no traço imenso
Do seu contorno
Essa coisa do amor
Essa coisa do contínuo
Essa coisa toda
que não cessa de acontecer
mesmo entendida
ou não classificada

...
     

quinta-feira, 3 de outubro de 2013

interjeição

é amor.

quanta

energia luminosa
acordo e durmo
tendo sobre o corpo
o seu peso
entre os pelos
a sua prosa

nada mais

acordo e sonho
acordo e me perco
onde estou eu
que não somente aqui
perdido encontrado
entre tanto
- tanto -
beijo

entre tanto
- mais tanto -
abraço

singular

encontro

nem posso me alongar
em elogios

é que esse é o tipo de encontro
que não convém explicar
este é
meu amor
o tipo de coisa
que enrosca as linhas
e nos faz pensar
via ponta dos dedos

pensar com carinho
pensar com cuidado
pensar com seu cheiro
a vigiar
minha inédita
paz
de existir
em meio a este mundo

tornado possível.
       

domingo, 29 de setembro de 2013

Filhote,

Papai voltou a ser criança

Fiquei do seu tamanho
pequeno, é verdade
nem tão gordo
nem tão esperto

Estou bebendo vinho
o dia inteiro

Lavei roupas
na máquina
que tanto te assustava

Mas agora
fui à cozinha
abri a geladeira para um pouco de água
E não te encontrei

Você não veio se coçar na minha perna
não veio falando baixo
como se dissesse
pai, me ama um pouco mais
hoje tá frio
e amanhã você viaja cedo
outra vez,


Eu te perdi, meu filho
Perdi você inteiro
num susto
num segundo

E só agora me veio todo o peso

Estou chateado, meu pequeno
queria ter te cuidado
mais e mais
e ter afastado os perigos todos desse mundo

Meu corpo dói
muito
Dói tudo

Amanhã viajo
ficarei uma semana fora
e voltarei querendo subir as escadas
e sentir sua sombra
atrás da porta
me esperando para contar
todo o seu dia
todo o seu tempo
sua forma de viver
e ser

em si próprio

a poesia mais gigante
e mais pequenina
que eu já conheci

Tudo foi tão rápido, Nanquim

Que eu tenho medo de fechar os olhos
e me perder da vida

Te amo, filho

Que triste tudo isso.

Levo na memória
seu rosto pequeno
indo e voltando
coçando-se
na barba preta
do meu rosto branco de pelos
após tantos gracejos.

Te amo, meu filho
Mesmo sendo tão triste tudo isso.



   

sábado, 28 de setembro de 2013

Arranho

Não foi como um sopro
apesar de breve
não foi leve
foi bruto
sujo
susto rouco
Eu perdi o meu gato
ele morreu hoje à tarde
Eu não sei o que fazer
dentro de casa
entre os seus pelos
voadores,

Tenho
tive
Tenho
tantas sensações imprecisas
Tanta coisa
me dizendo
aquilo que é
que não é
nem poderia ser,

Meu peito dói
minha capacidade de amar aumenta
mas e o cuidado?
Culpo-me em silêncio
para não exceder o tamanho da possível culpa
que talvez eu tenha
eu não temo ser culpado
É só que foi tão bruto
tudo foi tão rápido,

Meu filho
meu gatinho
imenso
peludo
animado
Foi embora sem me deixar lágrima capaz de contê-lo

Infeccionou-se brevemente
e ficou um dia mudo
parado
deitado sobre o tapete do banheiro

Cheguei em casa e falei
perguntei
fiz carinho
E nada

Liguei então para a veterinária.

Embrulhei meu filho
numa toalha toda colorida
Embrulhei e fui com ele no colo
atravessando as ruas
de cada avenida

Cheguei lá
e ele foi tratado
Estava com infecção costumeira
mas que em meu filho
Nunca antes havia morado

Deixei-o no soro
dormindo fora de casa
com o cuidado
(talvez duvidoso)
dos outros

Como saber?

Dormiu lá
Daí que acordei e liguei
para saber
Estava bem

Esteve bem
melhorando, segundo a segundo

Fui trabalhar e no instante de um segundo
me toca o telefone
para me informarem o improvável

Meu filho havia falecido

Fiquei mudo

o cigarro que fumava se apagou

Algo estranho em mim se plantou

até agora

Estou tentando

mas não vou conseguir

Quero dormir

e acordar entre pelos
num sonho impossível
onde eu seja um bicho
entre os seres gatos
imensos
poderosos
e cheios
cheios
de alguma indiferença
a lá raça humana.

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