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domingo, 31 de março de 2024

duração


subitamente perceberia que foi colocado em terceira pessoa
do singular
sempre mencionado antes em primeiríssima
agora restava como um ele estranho
sem elo com nada
abandonado de si

a provocar desinteresse nos ditos
outros

é que por muito tempo argumentou
que era assim que era
que assim era como deveria ser
e pronto
amanheceu noutro dia
incapaz de ser outro
e pronto
incapaz assim
tornou-se

em terceiro lugar
da fila do si mesmo
confiou errado
de que o hábito
seria passageiro

demandou tempo
até que a apatia
fosse convertida
em devida morte

até que morresse
continuaria ele a sua
odiosa e ostracizante
ode

eu sou assim
eu sou assim ué
eu sou assim mesmo qual problema
é assim que eu sou

(...)

e era

ele chato
ele ridículo
ele estúpido
insuportável mesmo

ele invariável
e sem força para
e sem ânimo para
e sem para para o que quer que viesse

ele era ele
ele apenas
ele apenas
e morreu, enfim.
  

não gracias


Pensava sobre grandes tarefas
Não obrigado
Tenho gastado a energia que
Resta em fazer o mínimo quase nada tão pouco ainda assim aqui estou pensava em quem já fui no que já fiz no tanto quanto imenso mas hoje não
Gracias não quero mais não tenho ganas no tengo o quê
Não tengo que querer não tenho o que querer
No tengo
 

domingo, 24 de março de 2024

Chei de medo


Medo por vezes transparece
brilha assim todo calmo
por saber da sua força dura
força inerte ele nada faz

E eu nesse enjoo.

Estou cheio de medo
e dentre a imensidão dele
transpira o medo de ferir
seu rosto, sua delicada paz

Não quero te machucar.

E não saberia fazer mais nada
agora sinto que é continuar
na esperança atenciosa de que
provavelmente tudo dará certo

E eu confio como quem já nada mais poderia.
 

sábado, 23 de março de 2024

deitado, resvalo

A dimensão dos seus problemas é a mesma
Mas ora acorda formiga ora aquela besta
Imensa que ante ao infortúnio 
Brilha seu famigerado orgulho 

Nós sabemos
A verdade é que saberíamos 
Houvesse ou não 
Justiça 

Nós sabemos 

Que na falta de uma falta 
Faltaria respeito 
Primeiro com o mundo 
Segundo consigo mesmo 

Respeito seria supor que
O problema é sol que amanhece 
Mais planetas que o seu só 
Umbigo

Respeito seria saber que hoje é assim 
Amanhã talvez inda aquilo 
E que riso e sono não se deve interromper 
Custe quem custaria 
 
Obrigado desde já 
 

quinta-feira, 21 de março de 2024

Bombom


Seria reconhecer o que há de bom
Nisso que tão bem te faz, coração 

Escrever 
Bom, escrever
Bem, é isso,
Não?

Bem bom
 

o seu amor


é bom
estar na mira
dele

 

Enquanto espero

Escrevo poemas
Enquanto espero
Não exatamente o ônibus 
A vida, talvez, enquanto espero
Escrevo poemas 

Sem antecipar sentidos 
Sem prever quiçá destinos 
Escrevo como quem
Como quem escreve
A despeito de

Triste foi ter escrito tanto 
A despeito de tudo ter escrito 
A despeito seguir a escrever
Mensagens a dizer aos homens 
Perdidos que eu fiz bastante 

Para os perder

Por isso escrevo. Enquanto espero
Eu escrevo poemas que 
A despeito da vida 
Eu escreveria. 
 

terça-feira, 12 de março de 2024

Hiperbolo

Não contente com tudo
Queres ainda o todo
O salto por cima do cimo
A baba ressequida após 
O gozo

Seu drama é romper barragem

Inconsciente tudo partes
Como se paz fosse terreno baldio
E você chuva torrente a abrir
Confins para além do sol

E dos solos, 
infelizmente 

Haverá talvez um dia
Que ante ao estrondo 
Ouvirás apenas estalo
Ante ao desassossego 
Dirás tudo bem, vamos s isso

e irias 
na confiança trémula 
de que também a vida
carece de tempo
para complicar-se toda
para tudo complicar
   

segunda-feira, 11 de março de 2024

Na destruição

Confiar sobretudo
Ela tem o seu tempo
O que lhe cabe fazer 
Faça 
O que não lhe cabe
Durma se possível for 

A destruição tem lá seu engenho 

Ela progressivamente faz moer
O osso faz desmanchar a capa
Que te protege ela como ácido 
Misturaria você com antepassados 
Tudo para ela é pasto

Enquanto dormes 
Farias o quê? 
O que cabe a ti a ti caberá fazer
O que não cabe não caberia
Não insista, homem, não insista

Soas ridículo quando tenta gritar ao mundo que te obedeça 

Mundo obedece apenas a destruição 
À destruição minhas preces todas 

Que Ela venha salvadora
Rompendo-me dos acostumados atos
Dos hábitos nos quais fiz morada 
Que Ela venha interromper o laço 

Vida não haveria não houvesse destruição. 
 

quinta-feira, 7 de março de 2024

desvio


meio vesgo confesso
o mundo assim hoje
o vejo como se não 
ousasse confiar que
a vida é escrita por
vias tantas que
mesmo a turvidão
era possibilidade

tento com esforço 
aceitar que agora
meus interesses
são estranhos 
a quem vinha eu
sendo mas como
saber que sou isso
ou era mesmo aquele

postergo a confirmação
sigo sendo estranho a mim
mesmo que eu possa me
apaixonar por esse novato
mesmo que possa voltar
ao poço fundo dos meus 
saudosos hoje antigos 
desejos mesmo assim

queria eu confiar que a mudança de fato fosse um virar de páginas como quem sem querer rasga um livro

marcado ele continua 
escrevendo outras cenas 
 

Esquecimento

Não que fosse um caso de acúmulo.

Havia era mais esquecimento. 

O tanto já feito era lembrado
apenas como o tanto já feito;
já sem peso era esse tanto, 
tanto e ainda assim sem desejo. 

Teria percebido assim que a vida
isso de estar vivo e à vida cosido 
que a vida seria algo então como
esquecimentos sucessivos. 

Vivemos para soterrar os acontecimentos vividos. 

Vivemos para superar a própria vida, não há mais dúvidas quanto a isso. 

Inventado foi que havia um sentido 
Um propósito, uma seta, um desenhado ímpeto, mas não 
Só o que havia, apenas o que haveria, 
Era mesmo isso: esquecer-se

Até já não mais lembrar, 
até já não precisar mais ser
nem aqui estar. 
 

sábado, 2 de março de 2024

tão mais


embarcar no belo barco furado
na pressa de um qualquer hábito 
não perguntarias sobre o remendo
que viste na carcaça ali colado 

o naufrágio anunciado
a sua tenaz indiferença 
a vida em aberto não te interessaria 
preferes já estar morto

a não ser que o cansaço 
subitamente assim viesse
e sobre ti tombasse sem
piedade e então 

Tu abandonarias essa viciada sina de imaginar aquilo que não tem fundamento 

Não tem.