(Num futuro não muito passado).
- Já está tudo muito difícil. Não pode ser outra hora?
- Não. Tem que ser agora. As coisas são difícies porque acontecem todas ao mesmo tempo.
- É o que estou te pedindo. Não vê que eu tô doendo?
- Vai ser melhor doer tudo agora. Deixa que o descanso vem em outro instante.
- Então, diga.
- Posso dizer?
- Eu disse, diga!
- Eu não sei se é o melhor momento.
- Eu disse que não era.
- Não digo por você e sim por mim. Eu não sei se é melhor eu voltar.
- Não, agora diga. Eu dentro já tento me proteger do possível acidente que juntos podemos conceber. Diga!
- Eu digo, então, mas peço que não reaja, que não faça nada até eu me retirar.
- E porque eu faria isso? Seria o mesmo do que eu não saber.
- Porque eu não sei.
- Então diga suas dores a uma árvore qualquer. Ou entenda que você só é dor quando tiver audiência.
- A árvore poderia secar.
- Então me diga, porque pelo menos eu posso te julgar.
- Eu te amo.
(Vertigem).
- Alguém tem que dizer alguma coisa.
- Você me pegou de surpresa.
- Não quer dizer muita coisa.
- O que você disse ou o fato de eu me surpreender?
- A sua reação.
- Não quer dizer muita coisa. Afinal, você pediu que eu não tivesse reação.
- Então essa sobriedade não é sua?
- Não, foi você quem pediu!
- E se eu pedisse que aos poucos você me mostrasse como é, você o faria?
- Você diz aos poucos?
- Bem devagar, é verdade. Eu tenho medo.
- Eu posso fazer isso. Observe minha boca.
- A boca?
- Sempre a boca primeiro. Observe a curva se criando nos lados. É um sorriso.
- Você sorri?
- Agora olhe os buracos que o seu amor criou em mim. Vê essa cova no rosto?
- São duas.
- Elas não moram aqui. São viajantes. Só pousam em mim quando eu amo, num instante.
- Você ama, então?
- Como não amar? Se a cada segundo que o tempo leva morrem amores com medo de se falar.
- Eu disse. Eu te disse.
- Deveria ter-me pedido para sentar. Não se costuma ouvir nada disso. Dizer eu te amo hoje pode matar.
- Não morre, por favor, eu retiro o que disse se for necessário.
- Não. O que você falou está flechado.
- Não morre.
- Morro feliz. Morro ser amado.
- Não.
(Ela cai ao chão).
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