É sempre um esforço, breve porém, recorrente, de capturar naquele segundo uma impaciência presente. Estava eu ali, então, sentado à mesa almoçando. Na taça um vinho ressentido magoava por dentro o meu ânimo, era eu todo contemplação. Pela janela, diante da mesa ainda com restos do pão da manhã, eu devolvia ao mundo a sua plenitude, o seu estado natural, a sua enfermidade concentrada. Era eu todo naquele momento caminho propício, eu era estrada.
De súbito, fosse de súbito um de repente brusco quase em chamas, dentro de mim se contorceu alguma coisa, alguma coisa que me estremeceu a montanha. Lá na frente, onde eu olhava a mastigar, a montanha virava impreciso e desta imprecisão me pûs a chorar. Primeiro o choro choca, não se pode de imediato acreditar. Depois os olhos ficando assim confusos, foi natural que eu soubesse me controlar. E dentro, a palavra-imagem MÃE não parava de bailar.
A captura veio ali, justamente quando eu constatei que seria incapaz de capturar. Veio uma fraqueza por reconhecer-se falível, capaz de deixar escapar. Uma quase resignação por saber - e talvez mesmo aceitar - que sim, muitos amores eu iria perder. Muitos amores para serem amores precisariam se afastar. Restou um lenço me dizendo isso não acaba o seu amor, amor pode ser mesmo eterno. Mas o que fazer com a eternidade? Queria eu nesse segundo ter em mãos, por sobre a mesa, o concreto, a presença, o embate. O que sou eu sem esse imediato?
Tentação. Eu assim sou alguma coisa que parte. Nos olhos as lágrimas ficaram e dali se perderam em meio a outras ações. O cotidiano avassala essa persistência na captura. Sempre traz diante ao semblante pasmo uma outra coisa que o entretem, como fosse entretenimento ajuda. Salvação. Eu ali diante das montanhas, acompanhando o vento movendo os prédios, eu ali era um protesto intacto dessa perdição. Dentro me dizendo sem parar, cara é melhor você ir se acostumando, não quer dizer não chorar, quer dizer apenas que não terás vida o suficiente para permitir a morte, será preciso se acostumar, ir se treinando, mas não desapaixonar. NÃO DESAPAIXONAR.
Era é sempre foi e será minha certeza. Não reduzir o amor quando diante da perda. Doar-se menos não é solução. Pois se eu te amo profundamente que se dane o resto, amar foi nossa construção. Não reduzir o amor diante da perda pois é de tanto perderes que se agiganta e um dia estarás no céu, tamanho amor insistente nas suas coisas e em suas crianças. O céu. Segredo. Envolto em nuvens. Será céu sinônimo de sossego?
Terminei de almoçar. Nada mais havia dentro de mim afora o bolo alimentar. Dentro as máquinas em mim organizando a energia. E lá fora, ainda no alto, perto da montanha que antes tremia, lá fora eu pude ver alguma coisa acenando que agora seria por demais complicado eu tentar te dizer. Por agora seria em excesso qualquer tentativa que extrapole esse silêncio, a apaziguar a alma doída.
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