Cansei de falar de filhos
Que não tenho.
Sou sozinho não tenho asas
Mas continuo morrendo.
Essa talvez seja a única firmeza
A única dureza na qual me debato
Porque há vida no desfazer
E refazer da mobília do quarto.
Cansei de falar de estrelas
Que nunca disse
De me expor em cores
Que extrapolam a minha
Falta de tons,
Meu sangue está velado em veias que não consigo cortar
Talvez pela falta de gilete
Talvez porque não tenha tempo para sequer me barbear.
O que eu quero dizer está sempre indo distante
E é distante porque não concretizo o instante
E durmo pensando em acordar
E beijo pensando no terminar
E vôo pensando em te encontrar.
São nessas azias
Que o meu dia arruína
Nessas melancolias
Que eu me perco
E me perder nem sempre me fascina,
Porque o encontro é preciso
Porque o encontro eu preciso
Nem que seja para o despedaçar
Nem que seja para alguma coisa que eu não possa aqui delimitar
Estou sobre cacos que não consigo juntar
Se paro eu vejo que não são cacos
Mas pedras pequenas que acompanham o meu caminhar
Que corre
E desce e sobe e vira e torce
Até eu precisar recomeçar
Com os pés ralados
Os olhos vencidos
E o sorriso amarelado.
Nada disso é metáfora
Tudo está assim consumado
O cabelo que temia sobre os olhos
Agora os olhos ultrapassam
As unhas pintadas pelo mundo
Pelos dentes são refeitas num segundo
E tudo está preso aqui dentro
Na confusão de um organismo ser.
Nada disso é o que não é
Tudo assim fica muito preciso
Como foi com seu beijo
Como foi com seu partir
Como foi quando eu chorei
E chorei sem ninguém poder me ouvir
Tudo assim dessa maneira
Hoje o domingo
Amanhã
Todos sabemos o que será
Já não posso continuar?
Sim, eu posso continuar.
Extrapolando os limites do possível
Refazendo as apostas num futuro imprevisível
Sim eu posso continuar
Basta acreditar
No instante deste segundo
Faze-lo durar o suficiente para ser duro
E não ar
E não vento
E não sempre tudo ser bem-estar.
O que se aprende com o amor
É que nem tudo se pode explicar.
Eu não me explico
Isso eu já sei
Eu não quero sentidos
Eu quero a confusão reinando em reis
Eu quero a lobotomia desta manhã
Eu quero a fome a fome a fome
Deixe assim estar
Deixe o tempo nublar
Saturar
Sucumbir
Eternizar
O movimento retrógrado dos homens que andam de costas
E que correm
E que borram
O chão
Espelhado
Dessa movimentação.
.
Nenhum comentário:
Postar um comentário