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terça-feira, 28 de dezembro de 2021

Sobre o horror. Mesmo.

Não tenho fala.

Vejo a bomba arrancando cabeças
a água subindo pelas valas
Não tenho fala, apenas contemplo,
não tenho fala.

Haveria de reagir? Como? De que modo
poderia eu responder ao horror deste mundo?

Fico mudo.

Não refuto a esperança nem incrimino as lideranças
que tentam semear a sopa entre bocas desdentadas.

Talvez eu tenha ficado mais frágil do que a força horrenda dos horrores.
Talvez nunca tenha sido outra coisa que não apenas mesquinho.

Mas é que se olho, quando olho, quando pouso os olhos
sobre o horror. Mesmo. Fico mudo, fico mundo, imundo.
O mundo sobre mim despenca e sobre mim escorre grudento.
Não há fuga há apenas este silêncio duradouro e branco,
leite morno e gosmento leite branco sem semeadura.

O horror me rouba a fala e me sinto bem no papel de quem foi roubado.

Não grito, não choro, nem peço ajuda.
Eu fico. Sobrevivo. Sobre o horror. Mesmo.
Cá estou: extático.
Gasto-me, enovelado, em considerações desprovidas de qualquer senso.
Observo como as pontas são cumes e como os sangues eram densos.
Tudo volteia, as copas incendiadas, os homens incendiários, um jet-ski.

Talvez sim esteja nascendo uma indiferença que outrora nos servirá de pavimento.

Já não sei sofrer o sofrimento.

Depois, no entanto, seria preciso que eu falasse dos meus privilégios. Quem me impede de reagir, por certo, são eles. Seriam?

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