ele olha adiante. engraçado como talvez nunca tenha olhado para trás. as mãos conservadas cada uma sobre uma bochecha. ele pensa que palavra estranha. ele pensa. ele nem sequer fala. olhando lá no adiante ele sente que ainda há chance. os cabelos emaranhados confessam explicitamente o nevoeiro do pensamento. queria ser grande. queria ser menos bronco ser ameno. os pequenos pelos dos dedos anunciam a maturidade semi-crescida.
adiante sempre adiante. ele olha enquanto pensa na família. a mão sobre a bochecha conforta o íntimo. poderia, se preciso, voar sentado, voar como voam os meninos nos livros de ficção. ele persiste ali sentado. no adiante se destaca uma sombra movediça. ele já nem vê. ele persiste. os olhos abertos mas fechados. uma dureza inconcreta. um silêncio concentrado. na frente um vulto feminino se move a gestos largos e ágeis. gestos feito traços.
sobre o papel espesso, a tinta azul vai criando novamente seu rosto sua preocupação seu descontentamento. ele ali sendo posto num pedaço de papel por ele que no adiante ele mantém entretida. ele poderia ficar ali. ela poderia também fazer o mesmo. e nisso ela faria também suas unhas bem desenhadas mas roídas. ela faria mais enovelamentos no cabelo. ela faria tudo incluindo a boca e as mordidas que a própria boca faz no seu beiço.
palavra feia. tudo bem. ela está ali para efetuar um ou outro remendo, sim, os cabelos mexidos as orelhas limpas. tudo conforme preza essa analogia (dele ali sentado e dele ali convertido em linha). ela o olha um segundo. ela cessa o movimento do risco e o olha. ele em silêncio - mais que antes - agoniza. o que foi? quer perguntar. o que foi?
ela olha como se houvesse encontrado o que nunca fora capaz de achar. como se tivesse descoberto algo que ninguém até então foi capaz de revelar. eles se miram. ela pensa em beijo. ela descobriu sua boca. ela voltou ao papel e a coloriu por inteiro. você tem lábios azuis. ela disse sem dizê-lo. eu não poderia dizer o porquê disso. ela o olhou mais uma vez e foi de novo se entreter sobre seu gesto ali não tão mais passageiro.
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