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sexta-feira, 22 de novembro de 2019

Largura

O sol, entrando delicado pela janela fechada do carro, fez com que ele se lembrasse do amor, agora, ultrapassado. Sorriu, calmo e grato, em agradecimento à maravilha que pode ser o tempo.

De fato, não se sentia mais preso. Ponderou que estar preso não é propriamente estar apaixonado. De fato, não mais junto, não mais tão dominado pelo apaixonamento súbito que havia o arrancado da vida. Não, de fato, agora estava mais solto. 

Dessa soltura, por conta desse largar - dessa largura - sentiu o sol como um acontecimento quase inédito. Pensou sobre a vida, sobre o tempo, novamente ele, mirando e sendo mexido pelos raios solares, pensou sobre si mesmo. Quem era, quem estava sendo, que havia sido, quanta coisa, se disse, quanta coisa em tão pouco tempo, não?

Alguma sabedoria caminhava rente ao seu corpo. As músicas de amor haviam perdido o sentido ou, irrevogável e subitamente, o conquistado. Tudo era mais evidente. O seu amor, sua disponibilidade, seus desejos e todo o empenho feito. Bem, tudo isso, apenas poderia existir se fosse em mútuo bom grado. Se não fosse bom para o par de amantes não seria bom para ninguém.

Isso ele sentia na pele. Rente. Era possível tocar. Assim como eram possíveis os raios solares daquela manhã quase quente.

Era essa a largura que abria sua vista, largura que o fazia rachar, que aliviava o seu peito. Ser largo é tudo menos pensar em si mesmo. Ser largo é saber-se parte, é saber-se porto e provisório, saber-se indo e feito passageiro ou mesmo passagem.

Os amores vão te chegar e nutridos de ti partirão. Assim é que é, moço. E ainda que partam, os amores, ainda que partam e haverão de partir, lembre-se, rapaz, haveria por vezes e mais vezes tanto o tempo quanto o sol. Eles estariam sempre aqui, rente a ti. Veja-os:

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