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domingo, 11 de setembro de 2016

A iminência da própria morte

Arranquei um dente.
Existe uma impaciência em mim que me impede de ter o devido cuidado comigo mesmo.
Arranquei-o, não me orgulho, sinto dores, mas sabia que isso seria o saldo de tal gesto.
Gesto sequer intempestivo. Gesto ciente. Eu sabia de tudo isso, porém, a dor é sempre um acontecimento.
Penso se não haveria uma iminência de morte em mim, sempre se anunciando, sempre fazendo composição com um ou outro gesto meu.
Penso que só poderia se tratar disso.
Tão simbólico, isso dos dentes. Meus dentes estão caindo, eu sinto, mas ainda que exista alguma abstração nisso tudo, eu estou os arrancando, de fato.
Dói ao mastigar, ao fumar, ao escovar, dói sem parar. E o que eu faço?
Eu tomo um anti-inflamatório para me esquecer da dor e aliviar.
Acordo mais morto a cada dia. Por que postergo tanto algum cuidado?
Se alguém me chama, clamando por cuidado, nem clamando, apenas se alguém me pede algo, eu já estou lá, todo me doando, todo servindo ao outro, mas, e quando é comigo?
O que eu faço?
O que faço comigo?
Durmo em dor. Acordo em dor. Vivo doendo.
Será que acho heróico tudo isso?
Queria ser menos idiota e dar um fim a isso?
Sabe o que faço?
Durmo então sem escovar os dentes.
Para desafiar, ou não, a dor que me mata, a morte que em mim permito que se escreva.

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