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domingo, 1 de novembro de 2009

Ela persiste.

Cada ação eu posso ver o fundo. Lá atrás, tentando ser escondido, ser disfarçado, eu posso ver esse lamento impreciso, lamento este por vezes mais forte. Olha os pássaros pela janela, fala pela primeira vez de suas cores. Como são belas. Arruma a casa toda. Bagunça e depois arruma. E me diz, olha, isso que eu faço é bom porque me distrái. É bom porque se eu estivesse sem fazer nada, estaria pensando no quê? Em todos os problemas que agora eu tento te esconder. Ela senta-se diante de mim, tem no olhar uma dor sem fim sem controle. Quer chorar, e se eu digo vem comigo, me conta o que é. Ela repete lamentando não é nada não, não é nada não. E fala das unhas, fala da televisão, fala o que você está ensaiando... Mas não! Como dói te ver assim. Como dói tanto não saber o que fazer, nem por você nem por mim. A outra fala, a mamãe fica sozinha o dia inteiro. Outro dia chegou aqui e me viu sentada, ouvindo o rádio, contando o peso. Não é tristeza, não é nada, é só o tempo. Eu estou ficando velha e meu futuro está já sendo, mas não como eu queria. Não. Como eu queria a casa cheia, aquela casa, cheia dessas crianças que hoje não estão aqui, cheia dos filhos crescidos mas com a barba feita. Cheia de qualquer coisa, pode ser cachorro ração cheia de objetos de afetos, com fogo na lareira. Ah, como está doendo ver tudo isso e não agir. Quero apressar o tempo e te fazer sorrir. Quero te puxar comigo e mudar meu destino. Te prender nele e te trazer comigo. Ah, mãe. Agora eu aqui na sua casa (e minha, eu sei), mas só sua, eu também sei. Eu aqui escrevendo isso que não posso te dizer, porque se dói tanto agora aqui, como deve ser para você? Ela veio, sentou-se à cama, disse se tem um filho que eu gostaria de morar é com você. E depois chorou, como quem pedisse desculpas por ter sido sincera. E eu vendo o esforço dela para se agarrar em alguém que a leve junto. Que desfaça a sua solidão. O que fazer, meu deus? O que posso fazer? Além de doer, sim, o que mais posso fazer?

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