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quarta-feira, 27 de abril de 2022

Dar nome

Não deixarei de fazê-lo.
Se digo que o suicídio anda
em mim andando
É porque já nos conhecemos. 
Sem espanto, à noite, deitado
Peço a ele que saia
Peço ao suicídio, por favor
Não durma ao meu lado. 

Sua existência não me assusta 
Antes me incomoda sua insistência
Desocupado, entrevejo sua face
Sempre que me fogem os sentidos.
E não posso ficar breve e perdido? 
Ele me olha com seus mil olhos
E sonolento me diz que a brevidade 
Não dura tantas horas assim, meu querido. 

Ergo-me buscando a força para um novo dia
Ele continua deitado à cama
O suicídio me desautoriza
Eu passo o café, tenho apenas uma caneca 
Nada lhe ofereço exceto minha atenção:
Olho bem seus olhos (são como os meus) 
E, enfim, percebo: o suicídio assim tão perto
Só está em mim porque em mim já não vivem 

Desejos.

No meio da cidade

Caminho até parar
Sobre um banco me sento
A cidade que me perdoe 
Mas foi preciso parar. 

Andar por andar andei bastante
Parar com convicção, no entanto 
E no meio da cidade,
É coisa deste instante. 

Nem tanto para observar 
Nem bem para descansar 
Para no meio da cidade para 
dar ao corpo a possibilidade do parar. 

Pois quantos movimentos já não acontecem
A despeito do se movimentar? 
Quantas ações, quantos gestos, 
já não acontecem sem acontecer? 

Parado no meio impreciso desta cidade
Não espero nem procuro, apenas duro
Sem desejo algum sem volúpia 
Sou menos que a paisagem

No entanto
Já não há exigências 
Existo tranquilo como a pomba
A cinza, o ladrilho, como a tarde. 

segunda-feira, 25 de abril de 2022