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quinta-feira, 27 de outubro de 2022

e a perna vai



58
honestamente 64
ainda assim as pernas
iam e foram
sobre mim
o peso sustentável
de uma leveza despropositada 

abri as pernas
como quem fosse elástico 
as dores as cãibras tudo isso
ali foi passado
pernas alegres
abertas em ato 

pensava sobre não saber o que trazem as peles 
pensava sobre um mundo onde todos fossem de si desconhecidos 
pensava se eu saberia dizer qual era o meu hino
pernas abertas
não lembrei de deus
mas de dar 

dar com a calma no muro
impedi-la de vazar
retendo o instante 
não para fazê-lo durar
mas para premê-lo
entre pernas

e só assim
bem suados
gozar


quarta-feira, 26 de outubro de 2022

onde escreves

 
pensava avulso sobre onde o onde
onde pousam os poemas
eles ocupam espaço tomam tudo
pousam por certo decolam
poema por quase todos os lados
ser menos gente
ser menos coisa
mas ser poema 
coisa meio gente meio outra coisa que jamais saberei como nomear

o poema pousa e faz festa

se não sei ainda como ser poema
que ao menos eu saiba como fazer festa 
 
 

quarta-feira, 19 de outubro de 2022

estandarte

 

quem sou já não sei,
mas sigo estando.

 

35 (trinta e cinco)

não houve comemoração
mas bem que pensei
sobre o que segue
sendo
estar vivo

nunca antes tão
sem contorno
a filosofia, enfim,
pousaria sobre
mim

sou todo sem ser inteiro
nasço renascido
em cada encontro
me desfaço
me entrevejo

e já não sou ontem
já não serei amanhã
a duração
instante
é o refrão maior

comemorar a inércia
a rigidez
comemorar certezas?
não não não mesmo
isso não

comemoro seguir vindo
e indo e vivente
comemoro os momentâneos
chãos
e tetos

os beijos comemoro
as barbas todas
as babas que saltam de ti
e afogam-se
em minhas bocas

comemoro o sexo
o frio a solidão implacável
comemoro a vontade de comer
comida
e a possibilidade de tê-la sobre o prato

comemoro em especial
este punhado de barbas prateadas
que perfuram o semblante negro
e fazem festa
festa platinada

eis onde estou
eis quem 'tou sendo
eis o que há
eis este tempo
...
 

s l i d e

sonolência

c h u v a lenta lenta

atraso institucionalizado

não faz mal não faz mal

sente-se



o café outro
o farelo voador
seu olhar sisudo
a perguntar
sem palavras
se isso é amor
é amor?
é amor



a cidade aproxima
os amantes
vagam perdidos
encontram-se
aos rompantes

agora

c h u v a firme firme

pesadas gotas

nem fim

nem triste



haveria sim, haveria



no frio é mais gostosinho
 

quarta-feira, 5 de outubro de 2022

celebrare

não celebras o aniversário
com a idade ele acabou
por perder a graça

nem sequer celebras
aquela vitória as vitórias
são mesmo ingratas

celebras a tremedeira
daqueles segundos
que ousaram-se em

minuto

não é por tanto
nem por pouco
é por isso

isso mesmo isso

aquela passagem
aquele vento que invade
a casa e a varre

celebras o fato de que mesmo morrendo
continuas vivo
celebras o queijo e o vinho

celebras a possibilidade
do singular e do plural
celebras os vocativos

todos que te chamam
cada qual tinha um nome
celebro-vos

a roupa está lavada
a louça semi-suja
a vida cansada

celebro esta cama que me olha
e me chama esta cama
que me ama

ela me ama.