mero desespero
Talvez
a comida não viesse assim tão agradável
Mesmo morna ou sem sal
cada gesto ali naquela esquina
Poderia soar como um pretexto
para um recomeço
Ou não
Ele
Pediu a conta
sacou o cartão da carteira
e debitou
ágil
o transtorno
que o debilitava
Eu pago
Não
Eu pago
Não precisa
Eu pago, eu pago, eu te convido, estou te convidando
E entrariam numa conversa secreta e sigilosa
sem voz conversa sem prosa
Está me convidando para o quê?
Estou te convidando para se perceber sem mim
Para quê?
Estou me convidando a te perder de mim
Você disse estar me convidando e te pergunto: convidando para quê?
Estou saindo de ti, provando a mim, mais a mim
mais a mim do que a você, tentando me provar que posso
posso eu ser eu mesmo sem você
Ele não vai me dizer nada?
E caminharam
desceram a pequena avenida
Era noite
talvez um dos dois pensasse
que chegariam num ponto
no qual o beijo fosse necessário
E de fato
sim
quando se despediram
deram aquele beijo automático
estalado
beijo sem estrelas
não estrelado
Deram-se um abraço
Um deles reconheceu que o outro estava mais encorpado
ao que esse disse
Estou me cuidando, estou me cuidando
E acabou a noite
E ele entrou no carro
E abaixou o vidro a tempo de dar um adeus
Não que viesse a ser o fim
mas era um novo fim
outro fim
sem trauma
Sem treta
Fim desejado por ele fim escolhido por ele modelado
Ele no volante
Ele pegando de volta
a vida
pelos cabelos oleosos e despenteados
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