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segunda-feira, 28 de junho de 2010

NUBLA

como secaste, ela o diz, vendo-o assim tão destituído de forças

como seu verso pifou, como sua poesia foi toda torda, ela o diz, vendo-o resvalar sobre papéis e cigarro

estou embriagado, vá com calma, estou embriagado

ela avança, ele se sente idiotizado

ela sabe como o importunar, avança sobre os saltos, que clichê, ela pousa sobre a mesa um embrulho

são para você, não são cigarros

são cigarros?

são para você.

ele abre o embrulho. dentro do embrulho outro embrulho, dentro outro ainda mais, dentre os outros, mais e mais papéis embrulhados fazendo mistério sobre coisa alguma

eu não entendi, ele a disse

ela confirmou, não era para entender

é uma provacação?
sim, uma provocação.

para quê?

para quem sabe te fazer perceber que acaba se ficando vazio quando se esconde do mundo tudo o que se tem dentro

de alguma coisa específica, você está falando de alguma coisa específica?

de você.

de mim.

de você.

de mim.

sim. de você.

não. não me sinto vazio…

ainda…

nem embrulhado.

estás.

embrulhado?

embrutecido, embriagado, achando ser mistério o que já é comum ao seu lado e você nem vê… porque se embriaga de novo ao se ver assim tão lindo persistindo sobre aquilo que – já sabes – nunca poderá compreender. você se faz de sofrido, ela o diz, você consegue me compreender?

estou embriagado.

sim. bebeu para isso. para se esconder. para se afastar do mundo. você não tem jeito.

eu não quero ter.

vou-me embora.

espere.

ela sai. ele persiste sobre a mesa. tentando não compreender.

Ocre Pele

Ama-me
sem medo ou restrições
Ama-me urgente
para evitar que eu pareça alguém doente
com sede e fome
e demente
a procura de amor.

Ama-me
sem perguntar sem nada dizer
Ama-me profundo
a tempo de me fazer esquecer
dos esquemas
dos meios
das estratégias que jogamos
para nos fazer valer,

eu te peço
AMA-ME

como se nisso residisse a razão do existir
do viver,
ama-me em cada respiro
ama-me sob variadas formas
mas não me deixe
perceber
que não me amas
ao me ver

assim

amanhecendo ao seu lado

com os cabelos mais idos do que voltados

assim destituído

da imagem linda que lá no início te cativou

ama-me sem relógio

eu sem pulseiras, nem brincos, nem roupas

ama-me pelo que somos, agora
no momento exato em que nada importa
exceto o calor
que nos dá força

mote ao seguir:

eu te peço, ama-me
como se o fizesse para ti.

sábado, 26 de junho de 2010

Ele, o Proboscídeo

ele olha
será que vê o adiante?
não.
talvez veja dentro.
dentro do distante.
possível previsão de um futuro ainda incerto.

ele olha
será que vê o disforme?
sim.
talvez veja o manto
que cobre as coisas
que se dizem existentes.

ele olha
hoje eu aqui a sua frente
será que vê em minha desforma
um caminho possível
um destino capaz de ser meio?

ele olha
e quanto mais eu falo mais ele some
em meio ao mundo de palavras
que eu lanço aqui nesta vala
buscando dizer
aquilo que pode apenas ser visto.