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sexta-feira, 5 de setembro de 2008

Material

No entanto, você não percebeu, que o sentido está nas coisas?

Não, eu realmente não havia percebido.

Tudo gira em torna de coisas, você não percebeu?

Não. Eu não percebi, quer dizer, eu não olhei. Quer dizer, eu olhei, mas não querendo ver isso, entende?

São coisas para tudo o que há, para todo o seu silêncio sempre uma coisa haverá.

Eu tenho dor na cabeça.

Assim como os remédios. Exato. Para cada coisa inventa-se um novo deles.

Um novo o quê?

Dor de cabeça, você disse. Poderia lhe citar inúmeras coisas que o curassem. Mas a questão é: de onde surgiu essa dor? Aliás, a questão talvez seja: não pode deixá-la passar no decorrer das horas?

Não, por favor, está doendo. Quero matá-la ainda agora.

É justo. Justíssimo. Porém, não vê aí o seu desejo da coisa acontecendo?

Que coisa é essa que você tá falando? Eu só pedi um remédio.

E nem pediu. Fui eu a dizer que poderia te dar...

Coisas. São só coisas. Seu dia não é melhor porque você comprou um lápis novo.

Você rouba? Você tem cara que rouba.

Não!

Mas já roubou, não?

Não! Como assim?! Caramba, que papo chato.

Não, não, não, não, não. Não fuja agora! Não fuja de mim. A noite já chegou e já tá passando e tudo o que eu quero é um copo de coca-cola. É poder falar coisas banais com você.

Não se perguntou que talvez eu não estivesse disposto?

Não me perguntei. Se perguntar demais é exagero. Eu vou logo é fazendo. E o que vier, virá vivendo.

Ai, começou.

Pára você de usar verbos com "ar" no final.

Primeira respiração.

Conjugação!

Eu dou o nome que quiser. A coisa é minha, você que vá embora.

E a casa é minha. E já passou da hora.

De quê? Pára com isso, vai sujar o carpete.

É um tapete. E novo. Na verdade é usado. Mas é novo aqui. Não tinha antes.

Tudo bem, novo ou velho tanto faz. Vai sujar o carpete...

TAPETE!

Ok. Você sempre vence, não? Chato!

Espera aqui. Vou buscar coca. Quando voltar, provocarei um desvio no seu septo nasal.

Que coisa louca, gente!

Isso, isso que você disse foi bem natural. Nem parece que você tá incomodado, viu?

Irônico.

Sonolento.

Bruxo.

Rabugento.

Rimas fáceis.

Faz um filho comigo?

O quê?

Então fura o dedo!

Pára com isso!

Um pacto?

Ai, você - definitivamente - é u ó.


Foi buscar a coca. Quando voltou até a sala, se assutou ao ver o outro e deixou o copo no chão cair. No chão sobre o qual o tapete-carpete adormecia. Agora, mijado.

quinta-feira, 4 de setembro de 2008

Por favor, não faça assim

Eu posso não aguentar
se ouvir você chorando
e sobretudo saber
que é por mim que assim você está.

Por favor, não se desespere
porque é no seu descabelar
que eu devo ir perceber
que essa dor que você sente
é por mim
não por você.

Por favor, não deixe
não me deixe perceber
que esse rio que de você corre
é de tamanho que sequer
um amor
pode compreender.

Não quero ter a medida do seu amor por mim
Não quero saber de que variadas formas gostaria de se morrer
acaso eu me fosse de ti.

Não é sempre que eu vá.
Mas nem sempre posso estar.
Como você pode compreender que quando não estou
ainda permaneço vivo?
Como pode saber que não estando agora
noutro momentoe starei para você?

Não me conte
Não me mostre
Eu prefiro morrer quieto e sozinho
Do que ter que junto a mim enterrar outros peitos de mim partidos

Não, não faça desse jeito
porque fica preso aqui na minha cabeça
feito grito assassinado!
assim feito trovejo
fica isso aqui bem costurado
que é o seu desesperar
que sua voz em meio ao pranto
tentando se fazer legível
tenta deter

Não faz isso comigo, meu filho!
Não faz isso comigo,
por favor!
mãe, um dia que um de nós morrer nem sei como vai ser...

segunda-feira, 1 de setembro de 2008

Virgindade

E mesmo que seja o fim
Tenho nele todo um pretexto
Para regar-me inteiro
Até secar o pranto.

Mesmo assim,
Trago em mim tal desejo
De ver rachar-se a base
primeiro
Para sobre ela
depois
Ir me perder
Até confundir
O que era na noite
O meu
eterno
Amanhecer.
.