Respondo em primeira pessoa, mesmo sem saber quais outras em mim estariam, o que mais além de mim neste eu sobrevive.
Respondo que a realização é um princípio cinético, fico todo arrepiado com esta possibilidade. Não é um retorno, não é bem uma saudade. Antes, realizar é fazer acerto de contas com a vida em sua vitalidade.
Vive-se mesmo que sem vida pujante. Vive-se mesmo que sem vida. Vive-se mesmo que sem desejar futuros, mesmo que sem desenhar paisagens.
Tenho cá meus motivos, para ter parado de desejar. Como máquina quebrada, fábrica de si ausentada, estive aqui mesmo sem estar. Sofri, chorei, comi, gozei, repetidas vezes, mas o brilho quase nada. A baixa saturação fez em mim duas épocas: o tudo e o sempre.
Agora, honesto, sinto que estou bem mais em algo no que em tudo. Bem menos querendo apenas sobreviver e mais mesmo estou querendo compor ruas, desatar sonos, germinar sobremesas, sei do cansaço, mas sei que cansei de estar cansado, foi por quantos anos?
Foi imenso.
Minha perspectiva é criar. Compor. Fazer e acontecer. E isso é sem gritaria. Mas escorre a gota, do ímpeto, da muita vontade, escorre quente o desejo da comunidade de agentes que mais e melhor fazem a tal bagunça corajosa.
Falo em primeira pessoa para falar para fora, bem fora, para falar ao que existe para além dos meus tão cansados medos.
Sobrevivi, facto. Agora desejo. Eu agora desejo.